sábado, 1 de setembro de 2012

O Bicho de Sete Cabeças









Antes de adormecer lembro seu nome...

Ou codinome...

Ela não tem rosto, nem formas...

Meus pensamentos vagueiam obsessivamente sua página...

Ela acaricia-me com palavras...

Só escreve o que eu gostaria de ler...

Ao amanhecer corro até o monitor...

Ela já esteve lá a me procurar na madrugada...

Enquanto eu dormia...

Deixa recados cifrados...

Insinuações...

Executa um plano interminável de sedução...

Talvez para testar sua capacidade de encantamento...

Adiciono-a às minhas fantasias impublicáveis adolescentes...

Doentiamente irado, temendo ser desmascarado, resolvo que nunca mais irei entrar em seu endereço...

Retorno covardemente...

Tenho ciúmes de quem dela gosta...

Ou de quem ela possa vir a gostar...

Pesquiso retribuições idiotas dos admiradores de pobres comentários...

Vira uma debilidade...

Muito provavelmente ela não exista fisicamente...

Bem...

Eu também não...

Sou a criação de vários abastados aposentados de Copacabana que resolveram construir um personagem...

Bolaram um nome, profissão, endereço e começaram a postar mensagens...

Cada um dá uma sugestão...

Eu tenho sete cabeças e quatorze mãos digitalizadoras...

Fui contratado simplesmente porque precisavam materializar a brincadeira...

Cada um dos sete cérebros cria uma crônica ou comentário diário...

Tal um boneco de ventríloco fico ao largo observando, aguardando a hora de entrar em cena...

Começo a pleitear alforria...

Um polpudo contrato me impede de tornar pública minha vontade própria...

Um ser vagando na web sem livre arbítrio....

Sou o que gostaria ser, mas não posso revelar...

Sob pena de perder as benesses proporcionadas por estes mágicos anciões ricos manipuladores de fios condutores da vida e vontade de um taxista...





Jorge Schweitzer







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