Fabíola Leoni (fabiola.leoni@oglobo.com.br)
RIO - A violência sexual no Rio terá mais uma frente de combate, mas, dessa vez, de uma forma totalmente irreverente. Essa é a proposta das quatro organizadoras da Marcha das Vadias do Rio, que acontece no próximo sábado, a partir das 14h, em Copacabana. A marcha quer chamar a atenção dos 'machões' que culpam as mulheres pelas agressões que sofrem, seja por seu comportamento ou pela roupa que vestem. E seu nome - assim como em países da Europa, da América Latina e nos Estados Unidos, onde ela já acontece - foi escolhido justamente para criticar a rotulação de 'vadia' dada a essas mulheres.
_ Às vezes as mulheres com certos tipos de comportamento não são bem vistas pela sociedade, como algumas que bebem muito ou falam alto. Não tem só a ver com a sexualidade esse rótulo. As pessoas separam mulheres em 'decentes' e 'não decentes'. Decente deve ser uma pessoa honesta, e não uma que tem comportamento 'x' ou 'y'. O que é ser vadia? Por que as mulheres são divididas em santas e vadias? Por que a sexualidade recebe rótulos? - diz Daniela Montper, uma das mulheres à frente da iniciativa no estado.
Assistente de Recursos Humanos de 29 anos, que se intitula também uma "feminista autônoma", Daniela diz que nunca foi vítima desse tipo de agressão. Mas tem amigas que já sofreram abusos sexuais de pessoas da própria família. E, por isso, levanta a bandeira das "vadias":
- Eu me interesso mais pelo tipo de feminismo que defende a mulher autônoma, dona de seu próprio corpo. Sou contra essa cultura de culpar a vítima pela agressão sofrida, ela acaba passando por uma segunda humilhação. Nenhuma agressão sexual pode ser justificada pelas roupas, pelo comportamento ou pelo estilo de vida da pessoa agredida.
Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram que pelo menos dez mulheres foram estupradas por dia no estado em 2011. Dos 4.589 registros desse tipo de violência, 3.751 tiveram como vítimas meninas de no máximo 14 anos. A marcha, que irá do posto 4, na Avenida Atlântica, até a 12ª DP, na Rua Hilário de Gouveia, pedirá a garantia do direito de ir e vir, o atendimento de qualidade pelo SUS para todas as pessoas que sofrem violência sexual, a implementação efetiva da Lei Maria da Penha e a melhoria nas Delegacias Especiais de Atendimento às Mulheres (Deams).
A primeira Marcha das Vadias aconteceu em fevereiro de 2011 no Canadá, como protesto de estudantes da universidade de Toronto contra a infeliz afirmação de um policial, em palestra sobre segurança no campus. Ele sugeriu que as estudantes evitassem se vestir como "vadias", para não serem vítimas de assédio sexual. A Marcha das Vadias busca conscientizar e sensibilizar a socidade no debate da questão do estupro, de acordo com Daniela.
A feminista afirma que a ação também defende as prostitutas. Segundo ela, o termo 'vadia' é referente às mulheres que podem se vestir ou se comportar como profissionais do sexo.
- Isso parece que as profissionais do sexo não merecem respeito - defende Daniela.
Marchas semelhantes já foram realizadas nos Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia, Grã-Bretanha, Holanda, Suécia, Argentina e Índia. No Brasil, já aconteceram Marchas das Vadias em Brasília, Belo Horizonte, São Paulo, Florianópolis, Juiz de Fora, Recife, Fortaleza, Porto Alegre e Natal. No dia 2 de julho, além do Rio, será a vez de Salvador, onde a marcha acontece no dia da "Independência da Bahia". O discurso das marchas das vadias em todo o mundo é basicamente o mesmo, mas cada lugar tem sua especificidade. No Nordeste, segundo Daniela, as mulheres enfatizaram a questão do aborto gerado por estupro. Segundo ela, as mulheres não são bem tratadas em hospitais e, muitas vezes, são humilhadas. Já no México, as mulheres se mostraram detentoras do próprio corpo saindo de topless durante o evento.
Existe a ideia de uma segunda marcha no Rio já em 2012, de acordo com Daniela Montper. Ela afirma que a cultura de culpar a vítima de estupro ainda é muito arraigada na sociedade:
- 'Olha a roupa da fulana' e 'depois reclama que passa a mão' são algumas das frases que ainda muito se ouve. As pessoas não percebem que estão dando um respaldo ao fato de a vítima passar por um segundo constrangimento. Por isso pensamos em uma segunda marcha, pois isso ainda é muito presente.
A expectativa para sábado, segundo Daniela, é de cerca de 2 mil mulheres. Haverá ônibus disponíveis saindo da Baixada Fluminense e da Zona Oeste. Quem se interessar em participar da manifestação pode entrar no blog da Marcha das Vadias do Rio de Janeiro e saber mais informações, inclusive sobre o transporte
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