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Mais importante:
Dr. Guilherme Shilling deixa claro que André Marins retirou Joanna do RioMar à revelia incorrendo no crime de Homicídio!
Agora, resta ao Dr. Murilo Kieling a decisão...
Jorge Schweitzer
Processo: 0251581-19.2010.8.19.0001 Acusada: SARITA FERNANDES PEREIRA e outro DECISÃO Trata-se de ação penal pública ajuizada pelo Ministério Público em face de SARITA FERNANDES PEREIRA e ALEX SANDRO DA CUNHA SOUZA, devidamente qualificados nos autos, dando a primeira acusada como incursa nas penas do artigo 282, parágrafo único c/c art. 29 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas pelo menos no mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar pelo segundo acusado), na forma do artigo 71, todos do CP; art. 171 n/f do art. 71 do CP, e art. 298 do CP; art. 121 , caput n/f do art. 13 §2º, incs. ´a´ e ´b´, todos do CP; e art. 33 da Lei 11.343/2006 n/f do art. 29 do CP, todos em concurso material (art. 69 do CP), e o segundo réu como incurso nas penas do art. 282, parágrafo único n/f do art. 71 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas durante o mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar); art. 282, parágrafo único c/c art. 285 (resultado morte) em relação à vítima Joanna; art. 171 n/f do art. 71 do CP e art. 304 do CP, e art. 33 da Lei 11.343/2006, todos em concurso material (art. 69 do CP), porque, consoante denúncia de fls. 02A/02D: ´No dia 16 de julho de 2010 (sexta-feira), no interior do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, a primeira denunciada (Sarita), na qualidade de médica plantonista e responsável pelo atendimento na emergência pediátrica da criança Joanna Cardoso Marcenal Marins, de 05 anos de idade, deu causa à morte da mesma, vez que podia e devia ter agido para evitar o resultado fatal. A primeira denunciada (Sarita), sendo agente garantidora e responsável pelo atendimento médico de urgência da criança Joanna, que se encontrava tendo convulsões, de forma omissiva deu causa ao resultado morte, no dia 13 de agosto de 2010, conforme comprova a certidão de óbito inclusa nos autos, e o AEC a ser oportunamente juntado. Ao prestar atendimento médico de urgência a vítima Joanna em estado de convulsão, sem que tivesse qualquer informação pregressa sobre os motivos ensejadores daquela situação, a primeira denunciada limitou-se a ministrar substâncias inibidoras desse estado convulsivo. Deixou a profissional de medicina, de atuar minimamente de forma correta, ao se omitir em internar a criança para realização de exames diversos que poderiam identificar a causa das convulsões e, por conseguinte, propiciar um tratamento adequado à vítima, ou determinar sua transferência para outro nosocômio que pudesse fazê-lo, ante o estado gravíssimo que se encontrava. Sarita assumiu o risco, com sua omissão, do óbito da infante, visto que deu alta hospitalar à mesma sem ter a mínima noção de qual a situação que causara as convulsões (por exemplo: meningite meningocócica, epilepsia, aneurisma, lesão, etc). Omitindo-se e procedendo totalmente em desacordo com protocolo médico exigível a espécie. Destaque-se que 'a falta de uma investigação clínica adequada nesses atendimentos não permitiu que fosse feito o diagnóstico etiológico das crises convulsivas, deixando o quadro evoluir até se tornar irreversível', conforme destaca perito médico legista do GATE do Ministério Público em parecer incluso nos autos. 2) Exercício irregular da medicina com resultado morte: Em 17 de julho de 2010 (sábado), nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar (dia seguinte ao atendimento acima relatado), o segundo denunciado (Alex), de forma consciente e voluntária, exerceu, a título oneroso, a função de médico, sem autorização legal, fazendo o atendimento de Joanna Cardoso Marcenal Marins. De 05 anos de idade, que veio a falecer em 13 de agosto de 2010, conforme comprova a certidão de óbito inclusa nos autos, e o AEC a ser oportunamente juntado. Na data acima, portanto menos de 24 horas após o atendimento omisso dado pela denunciada Sarita, a criança Joanna, reincidindo ao estado de convulsões, foi novamente levada ao Hospital Rio Mar, onde foi atendida pelo segundo acusado (Alex). O mesmo, acadêmico de medicina, mas atuando da forma fraudulenta descrita abaixo, atendeu a criança Joanna sem qualquer acompanhamento profissional, passando-se pelo médico André Almeida, este que sequer trabalhava no referido Hospital. Durante o atendimento, os denunciados mantiveram contato telefônico entre si. Nesse momento Sarita auxiliou Alex mais uma vez em seu iter criminis, conforme comprovado nos depoimentos e em conta reversa juntada no anexo. Por orientação de Sarita, Alex prestou à vítima Joanna o mesmo atendimento que a mesma havia recebido no dia anterior por parte de Sarita. Novamente a vítima somente recebeu remédios anti-convulsivos, sendo liberada do hospital, ainda desacordada. Ressalte-se que, por orientação da primeira acusada (Sarita), novamente não foram investigadas por exames, as causas das convulsões. Sarita, na qualidade de médica que teve contato direto com a vítima Joanna horas antes, mesmo sabedora do estado grave da vítima, e ainda que a mesma estaria sendo atendida por um acadêmico de medicina, sem qualquer preparo técnico para o referido socorro, determinou a liberação da mesma, sem qualquer exame ser realizado, ou ao menos sem solicitar atendimento por médico verdadeiro, ciente do evidente risco de vida exposto à criança. Com essas duas intervenções omissivas, a primeira acusada (Sarita) assumiu de forma clara a ocorrência do resultado morte, na forma de dolo eventual, visto ser sabedora por sua condição de médica pediatra, as consequências que possivelmente advém de um quadro de convulsões repetidas, de origem desconhecida, e não tratada, consequência essa que de fato adveio em 13 de agosto de 2010. O segundo acusado (Alex), com seu atendimento realizado no dia 17 de julho do presente ano, orientado pela primeira acusada (Sarita), via telefone, persistiu, mesmo diante do grave quadro, no exercício regular da medicina, de forma ilegal, e seu atendimento contribuiu de forma direta com a causa à morte da criança posteriormente, eis que esta foi privada de um socorro adequado. No dia posterior, em 18 de julho, a criança Joanna ainda desacordada, foi levada ao Hospital das Clínicas de Jacarepaguá, onde deu entrada em coma, e em estado gravíssimo, conforme atesta o prontuário médico, corroborado pelo parecer médico legista do GATE, horas depois desse segundo atendimento dado pelo segundo acusado. Nesse nosocômio foram realizados todos os exames, que deveriam ter sido feitos desde o primeiro atendimento dado por Sarita. Constatada a situação grave da criança, a mesma foi transferida para o Hospital AMIU horas após, quando já deu entrada com diagnóstico de morte cerebral. Ressalte-se a necessidade da transferência, eis que a AMIU possui CTI pediátrica, onde a vítima ficou internada até o dia de seu óbito, em 13 de agosto de 2010. Esta deveria ter sido a postura médica correta adotada desde o primeiro momento quando atendida pela denunciada Sarita. Se a vítima tivesse sido corretamente atendida e diagnosticada desde seu primeiro atendimento médico, constatando-se a origem das convulsões, devidamente tratada, poderia ter tido alguma chance de sobrevida, evitando-se assim o resultado morte que adveio. 3) Estelionato, falsificação e uso de documentos: Em período não determinado, sendo certo que ao menos durante o mês de julho de 2010, nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, os denunciados, de forma consciente e voluntária, em comunhão de ações e desígnios, obtiveram, para si ou para outrem vantagem ilícita, mediante fraude e induzimento em erro a terceiros, em prejuízo da citada unidade hospitalar e dos eventuais pacientes pediátricos de emergência que tivessem necessidade de atendimento durante o plantão do segundo acusado (Alex). Os acusados, de forma ainda consciente e voluntária, falsificaram uma carteira e um carimbo de médico, utilizando-se dos dados do médico André Lins de Almeida, sem ciência deste, bem como apresentaram um suposto currículo profissional, contendo dados inteiramente falsos. Os documentos eram usados pelo segundo acusado no Hospital Rio Mar. A vantagem ilícita auferida com a fraude consistiu, por parte da primeira acusada (Sarita), no recebimento de valores do Hospital para contratar médicos para os horários de plantão, conforme recibos juntados aos autos, sendo que ao colocar acadêmicos no lugar de médicos pagava àqueles valor muito inferior ao que seria devido a um profissional de medicina legalmente habilitado, percebendo com isso vantagem indevida no recebimento da diferença, sem efetivamente atuar pessoalmente no plantão, ou designar um profissional de medicina para a função. Enquanto isso, o segundo denunciado (Alex) recebia como vantagem indevida valores que seriam devidos a um profissional de medicina, que ele na condição de acadêmico, jamais auferiria. 4) Exercício ilegal da medicina: Em período não determinado, sendo certo que pelo menos durante o mês de julho de 2010, nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, o segundo denunciado (Alex), de forma consciente e voluntária, exercia, a título oneroso, a função de médico, sem autorização legal, prestando atendimento a inúmeras crianças, não identificadas até o momento, que chegavam no local em situação de emergência, em especial, da vítima Joanna Cardoso Marcenal Marins conforme acima exposto. O segundo denunciado (Alex) ainda na condição de estudante do quarto e quinto ano da Faculdade de Medicina, não poderia ter realizado seu intento, sem a participação direta e eficaz da primeira denunciada (Sarita), consciente e voluntariamente, aderiu ao propósito ilícito do primeiro denunciado (Alex), contribuindo, assim, para a ação criminosa deste, qual seja, o exercício ilegal da profissão de Medicina. 5) Tráfico ilícito de entorpecentes: Em 17 de julho de 2010, nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, o segundo denunciado (Alex), de forma consciente e voluntária, prescreveu e ministrou droga, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar. O acusado (Alex) prescreveu e ministrou na vítima fatal Joanna Marins os medicamentos FENOBARBITAL e FENITONA, substâncias psicotrópicas, sujeitas à notificação de receitas e de receitas de controle especial, de uso restrito, de acordo com a Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998 e RDC 40 de 15 de julho de 2009 (fls. 223/238 dos autos de Inquérito Policial em apenso). A primeira acusada (Sarita) participou dessa conduta, na medida em que orientou ao segundo acusado (Alex), instigando o mesmo a prescrever esses medicamentos, sabendo serem de uso restrito, e sabendo ser Alex incompetente para tal atuar. Dessa forma, o acusado Alex, de forma consciente e voluntária, prescreveu droga, sem autorização e em desacordo com determinação legal regulamentar, tendo como partícipe a denunciada Sarita.´ A denúncia veio instruída com o inquérito policial n.º 4343/2010, oriundo da DCAV (fls. 02H/419), bem como dos autos denominados ANEXO I e II e APENSO. Decisão às fls. 07/11 dos autos denominados ANEXO I, decretando a quebra do sigilo de dados telefônicos da linha 7817-9885, da operadora Nextel. Naqueles autos foram acostados os históricos de ligações. Registros de Ocorrência às fls. 03/05, 07/09, 33/35, 195/203, 250/257, 294/308, 329/330 e 500/501. Termos de declarações em sede policial às fls. 10/11, 12/13, 14/15, 37/39, 40/42, 91/92, 94/97, 98/99, 110/111, 112/114, 128/129, 130/132, 133/135, 136/138, 139/141, 142/145, 177/178, 188/184, 187/189, 218/221 e 292/293. Cópias do prontuário da vítima, oriundas da AMIU Botafogo e Hospital Rio Mar, respectivamente às fls. 48/85 e 331/332. Histórico de atendimento médico da vítima fornecido pela Unimed às fls. 87/88. Transcrição do Laudo do IML acostada às fls. 146/171. Auto de Colheita de Material para Exame Grafotécnico colhido de André Lins de Almeida às fls. 180/181. Curriculum Vitae em nome de André Lins Almeida às fls. 190/193. Cópia do Exame de líquor realizado na vítima às fls. 333/338. Laudo dermatológico às fls. 360. Fotografias da vítima, às fls. 378/381, juntadas pelo Ministério Público. Cópia de Boletim de Atendimento Médico em nome de Maria Eduarda Maia Furtado Marins às fls. 376. Informação Técnica das causas que levaram ao óbito da vítima às fls. 391/417. Decisão de recebimento da Denúncia, datada de 03/09/2010, às fls. 424/428, oportunidade em que o Juízo decretou a prisão preventiva dos acusados. Resposta à Acusação apresentada às fls. 431/446. Cópias de documentação médica da vítima oriundas do Hospital Rio Mar e Neurolife Laboratórios Ltda às fls. 465/493. Requerimento de habilitação, da mãe da vítima, como Assistente de Acusação (fls. 494) que foi deferido em Decisão de fls. 496/497. Complementação da resposta à acusação da ré SARITA às fls. 609/611, requerendo a expedição de ofício ao Hospital Rio Mar solicitando a ficha de atendimento médico da vítima, e a juntada de documentos às fls. 618/624. Parecer Técnico de perito do IML às fls. 671/674. Laudo de Exame de Corpo de Delito Necropsia às fls. 675/679. FAC da ré SARITA às fls. 775/777. Audiências de instrução e julgamento realizadas nos moldes das assentadas de fls. 787/793, 865/874 e 1006/1007, oportunidades em que foram ouvidas vinte testemunhas, seguindo-se o interrogatório da acusada às fls. 1015/1026. O Hospital Rio Mar requereu o seu ingresso como Assistente de Acusação às fls. 834/837. Após manifestação contrária do Parquet, o Juízo indeferiu o requerimento (fls. 787/793). Decisão às fls. 1032/1033 concedendo à ré a liberdade provisória. O Ministério Público em suas Alegações Finais (fls. 1056/1067), pugna pela pronúncia da acusada, nos termos da denúncia, o que foi secundado pela Assistência de Acusação às fls. 1093. A Defesa de SARITA, em suas alegações finais (fls. 1097/1117), sustenta a inépcia da denúncia, postulando no mérito a Absolvição da ré e eventualmente a desclassificação da conduta para a modalidade culposa. A peça final veio acompanhada dos documentos de fls. 1118/1228. Decisão às fls. 1230/1232 atendendo aos pedidos do Ministério Público e das defesas, determinando o remembramento do feito. Certidão cartorária às fls. 1236, quanto a juntada das peças do processo n.º 03425593-17.2011.8.19.0001, referente ao réu ALEX SANDRO DE CUNHA SOUZA. Resposta à acusação da defesa de ALEX às fls. 1248/1254. Audiência de instrução e julgamento ocorrida no bojo dos autos n.º 03425593-17.2011.8.19.0001 e realizada consoante assentadas de fls. 1278/1279, 1417/1418 e 1445, culminando com o interrogatório do acusado ALEX às fls. 1446/1451. O Ministério Público apresentou as alegações finais no feito remembrado às fls. 1460/1470, requerendo a pronúncia e o julgamento conjunto em função da conexão com o processo originário, o que foi ratificado pelo Assistente de Acusação (fls. 1477). A defesa de ALEX (fls. 1480/1511), por sua vez, manifestou-se pela inépcia da denúncia e pugnando, no mérito, pela absolvição sumária. Os autos foram encaminhados a este julgador com sugestão de remembramento conforme despacho de fls. 1515/1519, seguindo-se a reunião de feitos para julgamento conjunto (fls. 1522/1524). Certidão às fls. 1534/1535, informando o procedimento de remembramento. Pelo Juízo foi oportunizado às defesas (fls. 1541/1542) o reinterrogatório dos acusados, com o fito de permitir que, após a reunião dos feitos, as defesas pudessem formular perguntas reciprocamente quando da oitiva do co-réu, bem como visando atender completamente ao Princípio da Identidade Física do Juiz. As defesas técnicas, naquele ato, ratificaram os atos instrutórios acostados nos autos, bem como as alegações finais já ofertadas, abrindo mão do reinterrogatório. Vieram-me, então, conclusos os presentes autos. É o relatório. PASSO A DECIDIR. Prima facie, não merece acolhida a preliminar de inépcia da inicial acusatória ventilada pela defesa de SARITA, às fls. 1100. Com efeito, a denúncia oferecida pelo Ministério Público descreve de forma detalhada as condutas praticadas pelos Réus, de forma extensa e pormenorizada, não se podendo falar em ofensa à garantia de defesa dos mesmos. Note-se que o órgão ministerial logrou tecer a conduta desenvolvida por cada um dos acusados, indicando como se desenvolveu a conduta de cada um, tanto no que concerne ao atendimento médico da vítima quanto em relação aos delitos conexos. Insta acrescentar que as peças de informação fazem parte integrante da denúncia, e acompanham a inicial, servindo de fundamento para a narrativa feita pelo Parquet. Por óbvio, o maior detalhamento da conduta de cada um dos réus há de ser feito com a concatenação da narrativa feita na denúncia, e dos demais elementos coligidos no curso da investigação. Neste ponto, em especial, urge se destacar que a denúncia atribui à ré SARITA a verificação do resultado morte da infante, na posição de ´agente garantidor´ notadamente ao especificar às fls. 02-c: ´Sarita, na qualidade de médica que teve contato direto com a vítima Joanna horas antes, mesmo sabedora do estado grave da vítima, e ainda que a mesma estaria sendo atendida por um acadêmico de medicina, sem qualquer preparo técnico para o referido socorro, determinou a liberação da mesma, sem qualquer exame ser realizado, ou ao menos sem solicitar atendimento por médico verdadeiro, ciente do evidente risco de vida exposto à criança. Com essas duas intervenções omissivas, a primeira acusada (Sarita) assumiu de forma clara a ocorrência do resultado morte (....)´ Diante do retratado acima, o resultado morte lhe é atribuído em decorrência de duas atuações distintas - a primeira em decorrência da liberação precoce da vítima sem a realização de todos os exames necessários e a segunda em virtude da aposição de um ´falso médico´, com a sua ciência, para o atendimento da menor, expondo sua vida à risco. Claro está que, quando da subsunção típica, em evidente erro material, o órgão ministerial erroneamente fez alusão à norma do art. 13, § 2.º, alínea 'b' do Código Penal, quando o acertado seria a hipótese do art. 13, § 2.º alínea 'c' daquele diploma. Diante dos fatos narrados na denúncia, afigura-se necessária a emmendatio libelli, para a correta tipificação dos crimes. Atente-se que nos termos do art. 383 do Código Penal, com a redação trazida pela Lei 11.719/08, cabe ao julgador corrigir o equívoco quanto à subsunção do fato à norma incriminadora vulnerada, desde que não resulte em modificação de sua descrição. Muito embora a comparação dos aludidos dispositivos apresente-se tormentosa em um primeiro exame, a doutrina oferece diretrizes que asseguram a segura distinção, como se extrai dos preclaros ensinamentos de Sheila de Albuquerque Bierrenbach, senão vejamos: ´trata a alínea 'c' do atuar precedente ou da ingerência, segundo a qual aquele que, com sua conduta anterior, cria a situação de risco para o bem jurídico de terceiro está obrigado a agir, evitando que o perigo se converta em dano, sob pena de, omitindo-se, responder pelo resultado típico, como se o tivesse causado por via comissiva.´ (in: Crimes omissivos impróprios , p. 80) No caso dos autos, a denúncia é suficientemente clara, invocando à acusada SARITA, a falsificação de uma carteira e um carimbo de médico, utilizando-se dos dados de André Lins de Almeida, e apresentação de um suposto curriculum vitae para permitir a contratação de ALEX no hospital RioMar, por convite de SARITA. Segundo a inicial acusatória, o atendimento médico praticado por ALEX, com a ciência de SARITA teria influído no fatídico óbito de Joanna. A correção do equívoco quanto à subsunção típica realizada pelo órgão ministerial não implica em qualquer prejuízo para a nobre defesa, mormente em se atentando que o réu se defende dos fatos descritos, e não da capitulação dada aos mesmos. Tanto é que os réus desenvolveram suas extensas e aprofundadas alegações finais (1097/1117 e 1480/1512) estruturadas expressamente aludindo aos fatos invocados pelo Parquet. Superado este breve intróito, passemos, pois, ao exame das questões de fundo. Trata-se de ação penal de iniciativa pública imputando à ré SARITA a prática de homicídio doloso na forma omissiva imprópria, atribuindo-lhe a figura de 'agente garantidora' já que, nos exatos termos da denúncia, ´podia e devia ter agido para evitar o resultado fatal´. Sem prejuízo, o Parquet concebe ao réu ALEX SANDRO o delito de exercício irregular da medicina, qualificado pelo resultado morte, figurando a co-denunciada SARITA na condição de partícipe, todavia, apenas na modalidade simples daquela figura criminosa. Em seguida, a peça acusatória passa a elencar uma plêiade de delitos, notadamente a prática de estelionato, falsificação e uso de documento falso e tráfico de entorpecentes. Há de se destacar que neste momento processual, o juízo de admissibilidade há de ser realizado tão-somente relevando o crime doloso contra a vida imputado, em tese, sem análise aprofundada em relação aos delitos conexos. Corroborando tal orientação, temos as sempre preclaras e festejadas lições de Guilherme de Souza Nucci, em especial abordagem sobre o tema, senão vejamos: ´Havendo infração penal conexa, incluída na denúncia, devidamente recebida, pronunciando o réu pelo delito doloso contra a vida, deve o Juiz remeter a julgamento pelo Tribunal Popular os conexos, sem proceder a qualquer análise de mérito ou de admissibilidade quanto a eles. Aliás, se eram grotescos, atípicos ou inadmissíveis os tais delitos conexos, tão logo fosse oferecida a denúncia, caberia ao magistrado rejeitá-la. Entretanto, se acolheu a acusação, deve repassar ao juiz natural da causa (Tribunal do Júri) o seu julgamento.´ (in.: Tribunal do Júri; 1.ª Ed.; Editora Revista dos Tribunais; 2008; pg. 73) No mesmo sentido vem se posicionando a jurisprudência pátria, como se depreende do julgado seguinte: ´Verificada a presença de crimes conexos ao delito doloso contra a vida, o juiz natural da causa - incluindo aí os crimes conexos - será o Tribunal do Júri. (...) É que firmou-se a orientação no sentido de que, desde que não se revele totalmente despropositada a acusação referente aos crimes conexos, estes deverão ser julgados pelo Tribunal do Júri.´ (STJ - 5.ª Turma - HC 88.192-RS - Rel. Min. Felix Fischer - Julg. 08/11/2007) A norma contida no artigo 413, caput do Código de Processo Penal, determina que o Magistrado deve pronunciar o Réu quando convencido da existência do crime e de indícios de que o mesmo seja o seu Autor. Ressalte-se ainda, que descabe ao Juiz Sumariante a análise do mérito neste momento processual evitando, com sua decisão, induzir os Senhores Jurados no julgamento final. Deve, assim, reservar-se a remeter os réus à julgamento pelo Tribunal Popular tão, somente diante de indícios suficientes de autoria, que, apesar de ainda não constituírem prova cabal, já são capazes de possuir aspectos de verossimilhança com a imputação veiculada na denúncia. A materialidade do homicídio restou delineada pelos prontuários da vítima, oriundos da AMIU Botafogo (fls. 48/85) e do Hospital Rio Mar (fls. 331/332), pelo Histórico de atendimento médico da vítima fornecido pela Unimed às fls. 87/88, pela transcrição do Laudo do IML acostada às fls. 146/171, pelo Cópia do Exame de líquor realizado na vítima às fls. 333/338, pelo Laudo dermatológico às fls. 360, pelas Fotografias da vítima, às fls. 378/381, pela Informação Técnica das causas que levaram ao óbito da vítima às fls. 391/417, pelo Laudo de Exame de Corpo de Delito Necropsia às fls. 675/679. Os indícios da autoria, por sua vez, puderam ser hauridos em decorrência do relato de diversas testemunhas, e em especial do próprio acusado ALEX SANDRO, destacando a sua contratação e atuação fraudulenta quando do atendimento da criança Joanna, como se extrai dos excertos que seguem: ´(...) que no ano de 2009, conheceu a Dra. SARITA, não sabendo precisar a data; que na faculdade, soube por intermédio de um colega que não sabe dizer o nome que a Dra. SARITA estava contratando acadêmicos para que trabalhassem consigo; que então ligou para a Dra. SARITA; (...) que ao comparecer pessoalmente para uma entrevista com a Dra. SARITA, o denunciado, após indagado, informou ter experiência em pediatria; que em seus outros estágios o denunciado havia trabalhado com pediatria; (...) que indagado, o denunciado disse que não tinha experiência em emergência pediátrica; (...) que Dra. SARITA disse que seus acadêmicos trabalhavam com um carimbo de médico; (...) que então o acadêmico deveria comparecer ao hospital, com o carimbo e se identificar como médico; que Dra. SARITA disse que o acadêmico seria responsável por receber o dinheiro e depois repassar parte do valor; que Dra. SARITA colocou o interrogando para trabalhar em três unidades, quais sejam: Hospital Memorial em santa Cruz, na CEMERU em Santa Cruz, e posteriormente no Hospital Rio Mar; (...) que no Hospital Rio Mar, o interrogando revezava os plantões com a Dra. SARITA; que a cada 15 dias, o interrogando fazia o plantão de sábado à noite para a Dra. SARITA; que de 15 em 15 dias, o interrogando fazia um plantão de domingo à noite no Hospital Rio Mar; (...) que em todas as unidades, o interrogando se apresentou como sendo o médico ANDRÉ; que na conversa pessoal que teve com SARITA no Hospital Rio Mar, essa mostrou três carimbos de médicas; que Dra. SARITA perguntou ao interrogando se ele sabia o nome completo de um médico; que o interrogando sabia declinar o nome completo de ANDRÉ LINS DE ALMEIDA, médico com quem havia trabalhado no Hospital Prosim; que quando o interrogando disse o nome de Dr. ANDRÉ para SARITA ela falou que providenciaria ´tudo´; (...) que o interrogando se lembra da chegada de JOANNA no Hospital Rio Mar; que neste dia estava no consultório quando um pai abriu a porta e gritou: ´Emergência, emergência´; (...) que ao chegar na sala de emergência, percebeu que JOANNA estava em crise convulsiva; que ANDRÉ informou que havia procurado o Hospital Rio Mar na véspera, tendo apresentado uma receita com o carimbo da Dra. SARITA; que no anverso da receita constava a medicação que a criança deveria utilizar em casa, havendo indicação do remédio GARDENAL; que no verso estava descrita a medicação e a dosagem que havia sido ministrada na véspera, qual seja: HIDANTAL; que também constava no verso o telefone da Dra. SARITA; que ao atender JOANNA, pediu para a enfermagem puncionar a sua veia; que neste momento, ligou para Dra. SARITA; que Dra. SARITA disse se lembrar muito bem da criança e disse que, além do HIDANTAL, também havia ministrado DIAZEPAN e FENERGAN; que então Dra. SARITA disse que o interrogando deveria ministrar novamente o HIDANTAL, mas em uma dose menor; que Dra. SARITA disse que após ministrar o HIDANTAL, a menor deveria ficar em observação, a fim de que fosse aferido se o remédio estava fazendo efeito; (...) que Dra. SARITA determinou que após o FENOBARBITAL e o FENERGAN serem ministrados, a menor deveria permanecer no hospital até às 07:00 da manhã; que Dra. SARITA disse que às 07 da manhã passaria no hospital para visitar a criança; (...) que então ministrou FENOBARBITAL; que foi neste momento que conversou com ANDRÉ sobre a necessidade de JOANNA permanecer em observação até a manhã do dia seguinte; (...) que por volta de 04:00 h da manhã, ANDRÉ bateu no seu consultório e disse que estava indo embora; que ANDRÉ disse que JOANNA já estava bem e acordada, motivo pelo qual não pretendia ficar ´preso´ até as 07:00 da manhã; (...) que quando chegou na emergência, a enfermeira perguntou se poderia ´tirar o acesso da criança´; que o interrogando ficou sem saber o que fazer; que o interrogando indagou a ANDRÉ se este tinha certeza que queria ir embora e esse disse que sim; que ANDRÉ se dirigiu diretamente para a enfermeira e pediu para que fosse tirado o acesso da criança; que a enfermagem novamente indagou ao interrogando como proceder; que o interrogando disse que não poderia obrigar o pai a ficar; que então, ANDRÉ disse: ´Tira logo que eu vou embora.´; que assim ocorreu e ANDRÉ foi embora; (...) que em nenhum momento foi contratado pelo Hospital Rio Mar, mas pela Dra. SARITA; que em todas as suas fichas de atendimento, constava a Dra. SARITA como médica responsável; que em momento algum se apresentou Dra. SARITA como ANDRÉ; que Dra. SARITA sempre soube o correto nome do interrogando e sua condição de acadêmico; (...).´ A testemunha ANTÔNIO CARLOS, às fls. 908/911 também retratou como se deu a contratação de ALEX para atuar na emergência do hospital RioMar, como segue: ´(...) que o depoente é coordenador da emergência do hospital RioMar; que não conheceu pessoalmente o falso medico Alex; que Alex não tinha contrato de trabalho com o hospital RioMar; que no hospital existem duas Sub-Coordenadorias, uma da pediatria e uma da ortopedia; que ambas as Sub-Coordenadorias têm autonomia para trazerem pessoas para realizar plantão; que Alex prestou seus plantões perante a Sub-Coordenadoria de Pediatria; que a responsável pela contratação de Alex na Pediatria foi a Drª. Sarita; (...) que o pagamentos pelos plantões foi feito no nome do Dr. André Lins de Almeida; que o valor pago pelo plantão de 12 horas, em um mês, àquela época era R$1480,00 dividido em 4 ou 5 vezes dependendo do numero de semanas do mês; que após os fatos apurou-se que a sociedade Badra era integrada por Sarita; (...) que não sabe dizer como o currículo de André chegou até o arquivo; que o pagamento a André era feito com a inclusão do nome em uma lista, como ocorre com outros medico; que o pagamento precisa ser feito por intermédio de uma pessoa jurídica, e no caso de André foi feito por intermédio da Badra; (...) que indagado se o medico poderia transferir a avaliação clinica, incluindo a admissão, exame, diagnóstico, prescrição do tratamento e liberação ou alta a um terceiro não medico, respondeu que não; que a transferência do atendimento do paciente por um não medico compromete o resultado do tratamento; (...)´ Também mostrou-se bastante elucidativa a oitiva do médico ANDRÉ LINS DE ALMEIDA, merecendo especial atenção as partes destacadas de seu depoimento às fls. 1008/1014: ´(...) que conheceu o acusado Alex em plantão no Hospital de São João de Meriti e no Hospital do Guandu em Nova Iguaçu; que tais fatos ocorreram há cerca de dois anos atrás; que trabalhou com Alex em São João de Meriti por cerca de quatro a seis meses; (...) que Alex Sandro trabalhava como acadêmico de medicina; (...) que após verificar a fotografia de fls. 222 respondeu que com certeza a pessoa ali ilustrada é Alex; (...)´ Por fim, temos a importante narrativa da autoridade policial que presidiu a investigação, Dr. LUIZ HENRIQUE PEREIRA, cujo depoimento encontra-se acostado às fls. 912/917: ´(...) que acredita que Sarita prestou depoimento em três oportunidades; que em um primeiro momento, Sarita não falou do atendimento feito por Alex; que a ré confirmou que atendeu a criança; que Sarita chegou a dizer que o Dr. André também atendeu a vitima; que para o depoente, a conduta do suposto medico, Dr. André, não parecia estar correta, uma vez que liberou a criança ainda desacordada; que o depoente chegou a pesquisar na internet e achou o verdadeiro medico, Dr. André, e pediu que ele fosse ate a delegacia; (...) que quando descobriu-se a identidade do verdadeiro medico André Almeida, este foi chamado para depor e disse que não tinha nenhum contato com o réu Alex; (...) que apurou-se ao final da investigação que Alex foi contratado por Sarita, como consta no termo de depoimento do próprio Alex; (...) que Alex compareceu espontaneamente na delegacia e em seu depoimento apresentou a versão de que foi contratado por Sarita; que Alex disse que o currículo e a cédula de identidade não eram dele; que Alex confirmou que trabalhou em uma clinica que consta no currículo; que Alex chegou a mencionar que prescreveu os medicamentos à vitima; que após lido trecho de fls. 220, respondeu o depoente que foram aqueles os medicamentos que Alex mencionou; que se recorda de ter ouvido Alex falar que Sarita o orientou por telefone a deixar o país por um ou dois anos ate a poeira baixar; (...) que as imagens do circuito interno de TV foram mostradas a Alex, que se reconheceu e se identificou como a pessoa ilustrada; (...) que Alex falou que prescreveu os medicamentos sob orientação de Sarita; que o Dr. Antonio Carlos disse que Sarita era responsável pelo plantão e pela contratação de Alex; que Alex disse que recebia pessoalmente das mãos de Sarita e que já chegou a receber com cheque pessoal de Sarita; (...) que o depoente ouviu outros médicos do hospital RioMar que confirmaram que Sarita era a responsável pela contratação dos plantonistas; (...) que uma analise da conta reversa do telefone de Alex demonstra que ele se comunicava com Sarita, mesmo após os fatos ´virem à tona´; que Alex confirma isso em seu depoimento; (...) que Alex disse em seu depoimento que ele passou o numero de um CRM para Sarita, e depois esta lhe entregou um carimbo contendo o nome do verdadeiro Dr. André Almeida e o CRM passado por Alex; (...) que Alex disse que quando atendeu Joana, a criança foi liderada do hospital já acordada, entretanto, o pai e a madrasta, sem seus depoimentos afirmaram que no atendimento de Alex, a criança deixou o hospital ainda desacordada; (...)´ Diante desse contexto, não há como acolher-se a impronúncia pretendida pela defesa, ante os indícios suficientes de cometimento dos delitos, tais como apostos na inicial acusatória. Nesta fase deve vigorar o princípio in dubio pro societate, veja-se, a este respeito, os ensinamentos da Jurisprudência: ´Para pronúncia, basta o mero Juízo de probabilidade de que tenha havido um crime, à vista dos indícios de autoria e materialidade. Desnecessária a certeza de sua ocorrência, o que se reserva para a decisão definitiva do Júri. Nessa fase, há de se aplicar o provérbio in dubio pro societate, e não in dubio pro reo, para que não se abstraia o acusado de seu Juízo natural: o tribunal popular. Precedentes do STF e STJ.´ Resp. 115.601-RJ - 6ª Turma - Rel. Min. Anselmo Santiago CONCLUSÃO Ante o exposto, com fulcro no artigo 413, caput do Código de Processo Penal, PRONUNCIO os acusados SARITA FERNANDES PEREIRA como incursa nas penas do artigo 282, parágrafo único c/c art. 29 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas pelo menos no mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar pelo segundo acusado), na forma do artigo 71, todos do CP; art. 171 n/f do art. 71 do CP, e art. 298 do CP; art. 121 , caput n/f do art. 13 §2º, incs. ´a´ e ´b´, todos do CP; e art. 33 da Lei 11.343/2006 n/f do art. 29 do CP, todos em concurso material (art. 69 do CP) e ALEX SANDRO DA CUNHA SOUZA, como incurso nas penas do art. 282, parágrafo único n/f do art. 71 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas durante o mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar); art. 282, parágrafo único c/c art. 285 (resultado morte) em relação à vítima Joanna; art. 171 n/f do art. 71 do CP e art. 304 do CP, e art. 33 da Lei 11.343/2006, todos em concurso material, para que sejam submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri. Recomende-se o Réu ALEX na prisão onde se encontra, já que inalterados os pressupostos fáticos que lastrearam a recentíssima decisão de fls. 1536. Publique-se e intimem-se, dando ciência ao Ministério Público, à Assistência de Acusação e à Defensoria Pública. Com a preclusão, proceda-se na forma do art. 421 do CPP.
Dr. Guilherme Shilling deixa claro que André Marins retirou Joanna do RioMar à revelia incorrendo no crime de Homicídio!
Agora, resta ao Dr. Murilo Kieling a decisão...
Jorge Schweitzer
Processo: 0251581-19.2010.8.19.0001 Acusada: SARITA FERNANDES PEREIRA e outro DECISÃO Trata-se de ação penal pública ajuizada pelo Ministério Público em face de SARITA FERNANDES PEREIRA e ALEX SANDRO DA CUNHA SOUZA, devidamente qualificados nos autos, dando a primeira acusada como incursa nas penas do artigo 282, parágrafo único c/c art. 29 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas pelo menos no mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar pelo segundo acusado), na forma do artigo 71, todos do CP; art. 171 n/f do art. 71 do CP, e art. 298 do CP; art. 121 , caput n/f do art. 13 §2º, incs. ´a´ e ´b´, todos do CP; e art. 33 da Lei 11.343/2006 n/f do art. 29 do CP, todos em concurso material (art. 69 do CP), e o segundo réu como incurso nas penas do art. 282, parágrafo único n/f do art. 71 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas durante o mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar); art. 282, parágrafo único c/c art. 285 (resultado morte) em relação à vítima Joanna; art. 171 n/f do art. 71 do CP e art. 304 do CP, e art. 33 da Lei 11.343/2006, todos em concurso material (art. 69 do CP), porque, consoante denúncia de fls. 02A/02D: ´No dia 16 de julho de 2010 (sexta-feira), no interior do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, a primeira denunciada (Sarita), na qualidade de médica plantonista e responsável pelo atendimento na emergência pediátrica da criança Joanna Cardoso Marcenal Marins, de 05 anos de idade, deu causa à morte da mesma, vez que podia e devia ter agido para evitar o resultado fatal. A primeira denunciada (Sarita), sendo agente garantidora e responsável pelo atendimento médico de urgência da criança Joanna, que se encontrava tendo convulsões, de forma omissiva deu causa ao resultado morte, no dia 13 de agosto de 2010, conforme comprova a certidão de óbito inclusa nos autos, e o AEC a ser oportunamente juntado. Ao prestar atendimento médico de urgência a vítima Joanna em estado de convulsão, sem que tivesse qualquer informação pregressa sobre os motivos ensejadores daquela situação, a primeira denunciada limitou-se a ministrar substâncias inibidoras desse estado convulsivo. Deixou a profissional de medicina, de atuar minimamente de forma correta, ao se omitir em internar a criança para realização de exames diversos que poderiam identificar a causa das convulsões e, por conseguinte, propiciar um tratamento adequado à vítima, ou determinar sua transferência para outro nosocômio que pudesse fazê-lo, ante o estado gravíssimo que se encontrava. Sarita assumiu o risco, com sua omissão, do óbito da infante, visto que deu alta hospitalar à mesma sem ter a mínima noção de qual a situação que causara as convulsões (por exemplo: meningite meningocócica, epilepsia, aneurisma, lesão, etc). Omitindo-se e procedendo totalmente em desacordo com protocolo médico exigível a espécie. Destaque-se que 'a falta de uma investigação clínica adequada nesses atendimentos não permitiu que fosse feito o diagnóstico etiológico das crises convulsivas, deixando o quadro evoluir até se tornar irreversível', conforme destaca perito médico legista do GATE do Ministério Público em parecer incluso nos autos. 2) Exercício irregular da medicina com resultado morte: Em 17 de julho de 2010 (sábado), nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar (dia seguinte ao atendimento acima relatado), o segundo denunciado (Alex), de forma consciente e voluntária, exerceu, a título oneroso, a função de médico, sem autorização legal, fazendo o atendimento de Joanna Cardoso Marcenal Marins. De 05 anos de idade, que veio a falecer em 13 de agosto de 2010, conforme comprova a certidão de óbito inclusa nos autos, e o AEC a ser oportunamente juntado. Na data acima, portanto menos de 24 horas após o atendimento omisso dado pela denunciada Sarita, a criança Joanna, reincidindo ao estado de convulsões, foi novamente levada ao Hospital Rio Mar, onde foi atendida pelo segundo acusado (Alex). O mesmo, acadêmico de medicina, mas atuando da forma fraudulenta descrita abaixo, atendeu a criança Joanna sem qualquer acompanhamento profissional, passando-se pelo médico André Almeida, este que sequer trabalhava no referido Hospital. Durante o atendimento, os denunciados mantiveram contato telefônico entre si. Nesse momento Sarita auxiliou Alex mais uma vez em seu iter criminis, conforme comprovado nos depoimentos e em conta reversa juntada no anexo. Por orientação de Sarita, Alex prestou à vítima Joanna o mesmo atendimento que a mesma havia recebido no dia anterior por parte de Sarita. Novamente a vítima somente recebeu remédios anti-convulsivos, sendo liberada do hospital, ainda desacordada. Ressalte-se que, por orientação da primeira acusada (Sarita), novamente não foram investigadas por exames, as causas das convulsões. Sarita, na qualidade de médica que teve contato direto com a vítima Joanna horas antes, mesmo sabedora do estado grave da vítima, e ainda que a mesma estaria sendo atendida por um acadêmico de medicina, sem qualquer preparo técnico para o referido socorro, determinou a liberação da mesma, sem qualquer exame ser realizado, ou ao menos sem solicitar atendimento por médico verdadeiro, ciente do evidente risco de vida exposto à criança. Com essas duas intervenções omissivas, a primeira acusada (Sarita) assumiu de forma clara a ocorrência do resultado morte, na forma de dolo eventual, visto ser sabedora por sua condição de médica pediatra, as consequências que possivelmente advém de um quadro de convulsões repetidas, de origem desconhecida, e não tratada, consequência essa que de fato adveio em 13 de agosto de 2010. O segundo acusado (Alex), com seu atendimento realizado no dia 17 de julho do presente ano, orientado pela primeira acusada (Sarita), via telefone, persistiu, mesmo diante do grave quadro, no exercício regular da medicina, de forma ilegal, e seu atendimento contribuiu de forma direta com a causa à morte da criança posteriormente, eis que esta foi privada de um socorro adequado. No dia posterior, em 18 de julho, a criança Joanna ainda desacordada, foi levada ao Hospital das Clínicas de Jacarepaguá, onde deu entrada em coma, e em estado gravíssimo, conforme atesta o prontuário médico, corroborado pelo parecer médico legista do GATE, horas depois desse segundo atendimento dado pelo segundo acusado. Nesse nosocômio foram realizados todos os exames, que deveriam ter sido feitos desde o primeiro atendimento dado por Sarita. Constatada a situação grave da criança, a mesma foi transferida para o Hospital AMIU horas após, quando já deu entrada com diagnóstico de morte cerebral. Ressalte-se a necessidade da transferência, eis que a AMIU possui CTI pediátrica, onde a vítima ficou internada até o dia de seu óbito, em 13 de agosto de 2010. Esta deveria ter sido a postura médica correta adotada desde o primeiro momento quando atendida pela denunciada Sarita. Se a vítima tivesse sido corretamente atendida e diagnosticada desde seu primeiro atendimento médico, constatando-se a origem das convulsões, devidamente tratada, poderia ter tido alguma chance de sobrevida, evitando-se assim o resultado morte que adveio. 3) Estelionato, falsificação e uso de documentos: Em período não determinado, sendo certo que ao menos durante o mês de julho de 2010, nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, os denunciados, de forma consciente e voluntária, em comunhão de ações e desígnios, obtiveram, para si ou para outrem vantagem ilícita, mediante fraude e induzimento em erro a terceiros, em prejuízo da citada unidade hospitalar e dos eventuais pacientes pediátricos de emergência que tivessem necessidade de atendimento durante o plantão do segundo acusado (Alex). Os acusados, de forma ainda consciente e voluntária, falsificaram uma carteira e um carimbo de médico, utilizando-se dos dados do médico André Lins de Almeida, sem ciência deste, bem como apresentaram um suposto currículo profissional, contendo dados inteiramente falsos. Os documentos eram usados pelo segundo acusado no Hospital Rio Mar. A vantagem ilícita auferida com a fraude consistiu, por parte da primeira acusada (Sarita), no recebimento de valores do Hospital para contratar médicos para os horários de plantão, conforme recibos juntados aos autos, sendo que ao colocar acadêmicos no lugar de médicos pagava àqueles valor muito inferior ao que seria devido a um profissional de medicina legalmente habilitado, percebendo com isso vantagem indevida no recebimento da diferença, sem efetivamente atuar pessoalmente no plantão, ou designar um profissional de medicina para a função. Enquanto isso, o segundo denunciado (Alex) recebia como vantagem indevida valores que seriam devidos a um profissional de medicina, que ele na condição de acadêmico, jamais auferiria. 4) Exercício ilegal da medicina: Em período não determinado, sendo certo que pelo menos durante o mês de julho de 2010, nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, o segundo denunciado (Alex), de forma consciente e voluntária, exercia, a título oneroso, a função de médico, sem autorização legal, prestando atendimento a inúmeras crianças, não identificadas até o momento, que chegavam no local em situação de emergência, em especial, da vítima Joanna Cardoso Marcenal Marins conforme acima exposto. O segundo denunciado (Alex) ainda na condição de estudante do quarto e quinto ano da Faculdade de Medicina, não poderia ter realizado seu intento, sem a participação direta e eficaz da primeira denunciada (Sarita), consciente e voluntariamente, aderiu ao propósito ilícito do primeiro denunciado (Alex), contribuindo, assim, para a ação criminosa deste, qual seja, o exercício ilegal da profissão de Medicina. 5) Tráfico ilícito de entorpecentes: Em 17 de julho de 2010, nas dependências do setor de emergência pediátrica do Hospital Rio Mar, situado na Avenida Cândido Portinari, 555, Barra da Tijuca, nesta cidade, o segundo denunciado (Alex), de forma consciente e voluntária, prescreveu e ministrou droga, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar. O acusado (Alex) prescreveu e ministrou na vítima fatal Joanna Marins os medicamentos FENOBARBITAL e FENITONA, substâncias psicotrópicas, sujeitas à notificação de receitas e de receitas de controle especial, de uso restrito, de acordo com a Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998 e RDC 40 de 15 de julho de 2009 (fls. 223/238 dos autos de Inquérito Policial em apenso). A primeira acusada (Sarita) participou dessa conduta, na medida em que orientou ao segundo acusado (Alex), instigando o mesmo a prescrever esses medicamentos, sabendo serem de uso restrito, e sabendo ser Alex incompetente para tal atuar. Dessa forma, o acusado Alex, de forma consciente e voluntária, prescreveu droga, sem autorização e em desacordo com determinação legal regulamentar, tendo como partícipe a denunciada Sarita.´ A denúncia veio instruída com o inquérito policial n.º 4343/2010, oriundo da DCAV (fls. 02H/419), bem como dos autos denominados ANEXO I e II e APENSO. Decisão às fls. 07/11 dos autos denominados ANEXO I, decretando a quebra do sigilo de dados telefônicos da linha 7817-9885, da operadora Nextel. Naqueles autos foram acostados os históricos de ligações. Registros de Ocorrência às fls. 03/05, 07/09, 33/35, 195/203, 250/257, 294/308, 329/330 e 500/501. Termos de declarações em sede policial às fls. 10/11, 12/13, 14/15, 37/39, 40/42, 91/92, 94/97, 98/99, 110/111, 112/114, 128/129, 130/132, 133/135, 136/138, 139/141, 142/145, 177/178, 188/184, 187/189, 218/221 e 292/293. Cópias do prontuário da vítima, oriundas da AMIU Botafogo e Hospital Rio Mar, respectivamente às fls. 48/85 e 331/332. Histórico de atendimento médico da vítima fornecido pela Unimed às fls. 87/88. Transcrição do Laudo do IML acostada às fls. 146/171. Auto de Colheita de Material para Exame Grafotécnico colhido de André Lins de Almeida às fls. 180/181. Curriculum Vitae em nome de André Lins Almeida às fls. 190/193. Cópia do Exame de líquor realizado na vítima às fls. 333/338. Laudo dermatológico às fls. 360. Fotografias da vítima, às fls. 378/381, juntadas pelo Ministério Público. Cópia de Boletim de Atendimento Médico em nome de Maria Eduarda Maia Furtado Marins às fls. 376. Informação Técnica das causas que levaram ao óbito da vítima às fls. 391/417. Decisão de recebimento da Denúncia, datada de 03/09/2010, às fls. 424/428, oportunidade em que o Juízo decretou a prisão preventiva dos acusados. Resposta à Acusação apresentada às fls. 431/446. Cópias de documentação médica da vítima oriundas do Hospital Rio Mar e Neurolife Laboratórios Ltda às fls. 465/493. Requerimento de habilitação, da mãe da vítima, como Assistente de Acusação (fls. 494) que foi deferido em Decisão de fls. 496/497. Complementação da resposta à acusação da ré SARITA às fls. 609/611, requerendo a expedição de ofício ao Hospital Rio Mar solicitando a ficha de atendimento médico da vítima, e a juntada de documentos às fls. 618/624. Parecer Técnico de perito do IML às fls. 671/674. Laudo de Exame de Corpo de Delito Necropsia às fls. 675/679. FAC da ré SARITA às fls. 775/777. Audiências de instrução e julgamento realizadas nos moldes das assentadas de fls. 787/793, 865/874 e 1006/1007, oportunidades em que foram ouvidas vinte testemunhas, seguindo-se o interrogatório da acusada às fls. 1015/1026. O Hospital Rio Mar requereu o seu ingresso como Assistente de Acusação às fls. 834/837. Após manifestação contrária do Parquet, o Juízo indeferiu o requerimento (fls. 787/793). Decisão às fls. 1032/1033 concedendo à ré a liberdade provisória. O Ministério Público em suas Alegações Finais (fls. 1056/1067), pugna pela pronúncia da acusada, nos termos da denúncia, o que foi secundado pela Assistência de Acusação às fls. 1093. A Defesa de SARITA, em suas alegações finais (fls. 1097/1117), sustenta a inépcia da denúncia, postulando no mérito a Absolvição da ré e eventualmente a desclassificação da conduta para a modalidade culposa. A peça final veio acompanhada dos documentos de fls. 1118/1228. Decisão às fls. 1230/1232 atendendo aos pedidos do Ministério Público e das defesas, determinando o remembramento do feito. Certidão cartorária às fls. 1236, quanto a juntada das peças do processo n.º 03425593-17.2011.8.19.0001, referente ao réu ALEX SANDRO DE CUNHA SOUZA. Resposta à acusação da defesa de ALEX às fls. 1248/1254. Audiência de instrução e julgamento ocorrida no bojo dos autos n.º 03425593-17.2011.8.19.0001 e realizada consoante assentadas de fls. 1278/1279, 1417/1418 e 1445, culminando com o interrogatório do acusado ALEX às fls. 1446/1451. O Ministério Público apresentou as alegações finais no feito remembrado às fls. 1460/1470, requerendo a pronúncia e o julgamento conjunto em função da conexão com o processo originário, o que foi ratificado pelo Assistente de Acusação (fls. 1477). A defesa de ALEX (fls. 1480/1511), por sua vez, manifestou-se pela inépcia da denúncia e pugnando, no mérito, pela absolvição sumária. Os autos foram encaminhados a este julgador com sugestão de remembramento conforme despacho de fls. 1515/1519, seguindo-se a reunião de feitos para julgamento conjunto (fls. 1522/1524). Certidão às fls. 1534/1535, informando o procedimento de remembramento. Pelo Juízo foi oportunizado às defesas (fls. 1541/1542) o reinterrogatório dos acusados, com o fito de permitir que, após a reunião dos feitos, as defesas pudessem formular perguntas reciprocamente quando da oitiva do co-réu, bem como visando atender completamente ao Princípio da Identidade Física do Juiz. As defesas técnicas, naquele ato, ratificaram os atos instrutórios acostados nos autos, bem como as alegações finais já ofertadas, abrindo mão do reinterrogatório. Vieram-me, então, conclusos os presentes autos. É o relatório. PASSO A DECIDIR. Prima facie, não merece acolhida a preliminar de inépcia da inicial acusatória ventilada pela defesa de SARITA, às fls. 1100. Com efeito, a denúncia oferecida pelo Ministério Público descreve de forma detalhada as condutas praticadas pelos Réus, de forma extensa e pormenorizada, não se podendo falar em ofensa à garantia de defesa dos mesmos. Note-se que o órgão ministerial logrou tecer a conduta desenvolvida por cada um dos acusados, indicando como se desenvolveu a conduta de cada um, tanto no que concerne ao atendimento médico da vítima quanto em relação aos delitos conexos. Insta acrescentar que as peças de informação fazem parte integrante da denúncia, e acompanham a inicial, servindo de fundamento para a narrativa feita pelo Parquet. Por óbvio, o maior detalhamento da conduta de cada um dos réus há de ser feito com a concatenação da narrativa feita na denúncia, e dos demais elementos coligidos no curso da investigação. Neste ponto, em especial, urge se destacar que a denúncia atribui à ré SARITA a verificação do resultado morte da infante, na posição de ´agente garantidor´ notadamente ao especificar às fls. 02-c: ´Sarita, na qualidade de médica que teve contato direto com a vítima Joanna horas antes, mesmo sabedora do estado grave da vítima, e ainda que a mesma estaria sendo atendida por um acadêmico de medicina, sem qualquer preparo técnico para o referido socorro, determinou a liberação da mesma, sem qualquer exame ser realizado, ou ao menos sem solicitar atendimento por médico verdadeiro, ciente do evidente risco de vida exposto à criança. Com essas duas intervenções omissivas, a primeira acusada (Sarita) assumiu de forma clara a ocorrência do resultado morte (....)´ Diante do retratado acima, o resultado morte lhe é atribuído em decorrência de duas atuações distintas - a primeira em decorrência da liberação precoce da vítima sem a realização de todos os exames necessários e a segunda em virtude da aposição de um ´falso médico´, com a sua ciência, para o atendimento da menor, expondo sua vida à risco. Claro está que, quando da subsunção típica, em evidente erro material, o órgão ministerial erroneamente fez alusão à norma do art. 13, § 2.º, alínea 'b' do Código Penal, quando o acertado seria a hipótese do art. 13, § 2.º alínea 'c' daquele diploma. Diante dos fatos narrados na denúncia, afigura-se necessária a emmendatio libelli, para a correta tipificação dos crimes. Atente-se que nos termos do art. 383 do Código Penal, com a redação trazida pela Lei 11.719/08, cabe ao julgador corrigir o equívoco quanto à subsunção do fato à norma incriminadora vulnerada, desde que não resulte em modificação de sua descrição. Muito embora a comparação dos aludidos dispositivos apresente-se tormentosa em um primeiro exame, a doutrina oferece diretrizes que asseguram a segura distinção, como se extrai dos preclaros ensinamentos de Sheila de Albuquerque Bierrenbach, senão vejamos: ´trata a alínea 'c' do atuar precedente ou da ingerência, segundo a qual aquele que, com sua conduta anterior, cria a situação de risco para o bem jurídico de terceiro está obrigado a agir, evitando que o perigo se converta em dano, sob pena de, omitindo-se, responder pelo resultado típico, como se o tivesse causado por via comissiva.´ (in: Crimes omissivos impróprios , p. 80) No caso dos autos, a denúncia é suficientemente clara, invocando à acusada SARITA, a falsificação de uma carteira e um carimbo de médico, utilizando-se dos dados de André Lins de Almeida, e apresentação de um suposto curriculum vitae para permitir a contratação de ALEX no hospital RioMar, por convite de SARITA. Segundo a inicial acusatória, o atendimento médico praticado por ALEX, com a ciência de SARITA teria influído no fatídico óbito de Joanna. A correção do equívoco quanto à subsunção típica realizada pelo órgão ministerial não implica em qualquer prejuízo para a nobre defesa, mormente em se atentando que o réu se defende dos fatos descritos, e não da capitulação dada aos mesmos. Tanto é que os réus desenvolveram suas extensas e aprofundadas alegações finais (1097/1117 e 1480/1512) estruturadas expressamente aludindo aos fatos invocados pelo Parquet. Superado este breve intróito, passemos, pois, ao exame das questões de fundo. Trata-se de ação penal de iniciativa pública imputando à ré SARITA a prática de homicídio doloso na forma omissiva imprópria, atribuindo-lhe a figura de 'agente garantidora' já que, nos exatos termos da denúncia, ´podia e devia ter agido para evitar o resultado fatal´. Sem prejuízo, o Parquet concebe ao réu ALEX SANDRO o delito de exercício irregular da medicina, qualificado pelo resultado morte, figurando a co-denunciada SARITA na condição de partícipe, todavia, apenas na modalidade simples daquela figura criminosa. Em seguida, a peça acusatória passa a elencar uma plêiade de delitos, notadamente a prática de estelionato, falsificação e uso de documento falso e tráfico de entorpecentes. Há de se destacar que neste momento processual, o juízo de admissibilidade há de ser realizado tão-somente relevando o crime doloso contra a vida imputado, em tese, sem análise aprofundada em relação aos delitos conexos. Corroborando tal orientação, temos as sempre preclaras e festejadas lições de Guilherme de Souza Nucci, em especial abordagem sobre o tema, senão vejamos: ´Havendo infração penal conexa, incluída na denúncia, devidamente recebida, pronunciando o réu pelo delito doloso contra a vida, deve o Juiz remeter a julgamento pelo Tribunal Popular os conexos, sem proceder a qualquer análise de mérito ou de admissibilidade quanto a eles. Aliás, se eram grotescos, atípicos ou inadmissíveis os tais delitos conexos, tão logo fosse oferecida a denúncia, caberia ao magistrado rejeitá-la. Entretanto, se acolheu a acusação, deve repassar ao juiz natural da causa (Tribunal do Júri) o seu julgamento.´ (in.: Tribunal do Júri; 1.ª Ed.; Editora Revista dos Tribunais; 2008; pg. 73) No mesmo sentido vem se posicionando a jurisprudência pátria, como se depreende do julgado seguinte: ´Verificada a presença de crimes conexos ao delito doloso contra a vida, o juiz natural da causa - incluindo aí os crimes conexos - será o Tribunal do Júri. (...) É que firmou-se a orientação no sentido de que, desde que não se revele totalmente despropositada a acusação referente aos crimes conexos, estes deverão ser julgados pelo Tribunal do Júri.´ (STJ - 5.ª Turma - HC 88.192-RS - Rel. Min. Felix Fischer - Julg. 08/11/2007) A norma contida no artigo 413, caput do Código de Processo Penal, determina que o Magistrado deve pronunciar o Réu quando convencido da existência do crime e de indícios de que o mesmo seja o seu Autor. Ressalte-se ainda, que descabe ao Juiz Sumariante a análise do mérito neste momento processual evitando, com sua decisão, induzir os Senhores Jurados no julgamento final. Deve, assim, reservar-se a remeter os réus à julgamento pelo Tribunal Popular tão, somente diante de indícios suficientes de autoria, que, apesar de ainda não constituírem prova cabal, já são capazes de possuir aspectos de verossimilhança com a imputação veiculada na denúncia. A materialidade do homicídio restou delineada pelos prontuários da vítima, oriundos da AMIU Botafogo (fls. 48/85) e do Hospital Rio Mar (fls. 331/332), pelo Histórico de atendimento médico da vítima fornecido pela Unimed às fls. 87/88, pela transcrição do Laudo do IML acostada às fls. 146/171, pelo Cópia do Exame de líquor realizado na vítima às fls. 333/338, pelo Laudo dermatológico às fls. 360, pelas Fotografias da vítima, às fls. 378/381, pela Informação Técnica das causas que levaram ao óbito da vítima às fls. 391/417, pelo Laudo de Exame de Corpo de Delito Necropsia às fls. 675/679. Os indícios da autoria, por sua vez, puderam ser hauridos em decorrência do relato de diversas testemunhas, e em especial do próprio acusado ALEX SANDRO, destacando a sua contratação e atuação fraudulenta quando do atendimento da criança Joanna, como se extrai dos excertos que seguem: ´(...) que no ano de 2009, conheceu a Dra. SARITA, não sabendo precisar a data; que na faculdade, soube por intermédio de um colega que não sabe dizer o nome que a Dra. SARITA estava contratando acadêmicos para que trabalhassem consigo; que então ligou para a Dra. SARITA; (...) que ao comparecer pessoalmente para uma entrevista com a Dra. SARITA, o denunciado, após indagado, informou ter experiência em pediatria; que em seus outros estágios o denunciado havia trabalhado com pediatria; (...) que indagado, o denunciado disse que não tinha experiência em emergência pediátrica; (...) que Dra. SARITA disse que seus acadêmicos trabalhavam com um carimbo de médico; (...) que então o acadêmico deveria comparecer ao hospital, com o carimbo e se identificar como médico; que Dra. SARITA disse que o acadêmico seria responsável por receber o dinheiro e depois repassar parte do valor; que Dra. SARITA colocou o interrogando para trabalhar em três unidades, quais sejam: Hospital Memorial em santa Cruz, na CEMERU em Santa Cruz, e posteriormente no Hospital Rio Mar; (...) que no Hospital Rio Mar, o interrogando revezava os plantões com a Dra. SARITA; que a cada 15 dias, o interrogando fazia o plantão de sábado à noite para a Dra. SARITA; que de 15 em 15 dias, o interrogando fazia um plantão de domingo à noite no Hospital Rio Mar; (...) que em todas as unidades, o interrogando se apresentou como sendo o médico ANDRÉ; que na conversa pessoal que teve com SARITA no Hospital Rio Mar, essa mostrou três carimbos de médicas; que Dra. SARITA perguntou ao interrogando se ele sabia o nome completo de um médico; que o interrogando sabia declinar o nome completo de ANDRÉ LINS DE ALMEIDA, médico com quem havia trabalhado no Hospital Prosim; que quando o interrogando disse o nome de Dr. ANDRÉ para SARITA ela falou que providenciaria ´tudo´; (...) que o interrogando se lembra da chegada de JOANNA no Hospital Rio Mar; que neste dia estava no consultório quando um pai abriu a porta e gritou: ´Emergência, emergência´; (...) que ao chegar na sala de emergência, percebeu que JOANNA estava em crise convulsiva; que ANDRÉ informou que havia procurado o Hospital Rio Mar na véspera, tendo apresentado uma receita com o carimbo da Dra. SARITA; que no anverso da receita constava a medicação que a criança deveria utilizar em casa, havendo indicação do remédio GARDENAL; que no verso estava descrita a medicação e a dosagem que havia sido ministrada na véspera, qual seja: HIDANTAL; que também constava no verso o telefone da Dra. SARITA; que ao atender JOANNA, pediu para a enfermagem puncionar a sua veia; que neste momento, ligou para Dra. SARITA; que Dra. SARITA disse se lembrar muito bem da criança e disse que, além do HIDANTAL, também havia ministrado DIAZEPAN e FENERGAN; que então Dra. SARITA disse que o interrogando deveria ministrar novamente o HIDANTAL, mas em uma dose menor; que Dra. SARITA disse que após ministrar o HIDANTAL, a menor deveria ficar em observação, a fim de que fosse aferido se o remédio estava fazendo efeito; (...) que Dra. SARITA determinou que após o FENOBARBITAL e o FENERGAN serem ministrados, a menor deveria permanecer no hospital até às 07:00 da manhã; que Dra. SARITA disse que às 07 da manhã passaria no hospital para visitar a criança; (...) que então ministrou FENOBARBITAL; que foi neste momento que conversou com ANDRÉ sobre a necessidade de JOANNA permanecer em observação até a manhã do dia seguinte; (...) que por volta de 04:00 h da manhã, ANDRÉ bateu no seu consultório e disse que estava indo embora; que ANDRÉ disse que JOANNA já estava bem e acordada, motivo pelo qual não pretendia ficar ´preso´ até as 07:00 da manhã; (...) que quando chegou na emergência, a enfermeira perguntou se poderia ´tirar o acesso da criança´; que o interrogando ficou sem saber o que fazer; que o interrogando indagou a ANDRÉ se este tinha certeza que queria ir embora e esse disse que sim; que ANDRÉ se dirigiu diretamente para a enfermeira e pediu para que fosse tirado o acesso da criança; que a enfermagem novamente indagou ao interrogando como proceder; que o interrogando disse que não poderia obrigar o pai a ficar; que então, ANDRÉ disse: ´Tira logo que eu vou embora.´; que assim ocorreu e ANDRÉ foi embora; (...) que em nenhum momento foi contratado pelo Hospital Rio Mar, mas pela Dra. SARITA; que em todas as suas fichas de atendimento, constava a Dra. SARITA como médica responsável; que em momento algum se apresentou Dra. SARITA como ANDRÉ; que Dra. SARITA sempre soube o correto nome do interrogando e sua condição de acadêmico; (...).´ A testemunha ANTÔNIO CARLOS, às fls. 908/911 também retratou como se deu a contratação de ALEX para atuar na emergência do hospital RioMar, como segue: ´(...) que o depoente é coordenador da emergência do hospital RioMar; que não conheceu pessoalmente o falso medico Alex; que Alex não tinha contrato de trabalho com o hospital RioMar; que no hospital existem duas Sub-Coordenadorias, uma da pediatria e uma da ortopedia; que ambas as Sub-Coordenadorias têm autonomia para trazerem pessoas para realizar plantão; que Alex prestou seus plantões perante a Sub-Coordenadoria de Pediatria; que a responsável pela contratação de Alex na Pediatria foi a Drª. Sarita; (...) que o pagamentos pelos plantões foi feito no nome do Dr. André Lins de Almeida; que o valor pago pelo plantão de 12 horas, em um mês, àquela época era R$1480,00 dividido em 4 ou 5 vezes dependendo do numero de semanas do mês; que após os fatos apurou-se que a sociedade Badra era integrada por Sarita; (...) que não sabe dizer como o currículo de André chegou até o arquivo; que o pagamento a André era feito com a inclusão do nome em uma lista, como ocorre com outros medico; que o pagamento precisa ser feito por intermédio de uma pessoa jurídica, e no caso de André foi feito por intermédio da Badra; (...) que indagado se o medico poderia transferir a avaliação clinica, incluindo a admissão, exame, diagnóstico, prescrição do tratamento e liberação ou alta a um terceiro não medico, respondeu que não; que a transferência do atendimento do paciente por um não medico compromete o resultado do tratamento; (...)´ Também mostrou-se bastante elucidativa a oitiva do médico ANDRÉ LINS DE ALMEIDA, merecendo especial atenção as partes destacadas de seu depoimento às fls. 1008/1014: ´(...) que conheceu o acusado Alex em plantão no Hospital de São João de Meriti e no Hospital do Guandu em Nova Iguaçu; que tais fatos ocorreram há cerca de dois anos atrás; que trabalhou com Alex em São João de Meriti por cerca de quatro a seis meses; (...) que Alex Sandro trabalhava como acadêmico de medicina; (...) que após verificar a fotografia de fls. 222 respondeu que com certeza a pessoa ali ilustrada é Alex; (...)´ Por fim, temos a importante narrativa da autoridade policial que presidiu a investigação, Dr. LUIZ HENRIQUE PEREIRA, cujo depoimento encontra-se acostado às fls. 912/917: ´(...) que acredita que Sarita prestou depoimento em três oportunidades; que em um primeiro momento, Sarita não falou do atendimento feito por Alex; que a ré confirmou que atendeu a criança; que Sarita chegou a dizer que o Dr. André também atendeu a vitima; que para o depoente, a conduta do suposto medico, Dr. André, não parecia estar correta, uma vez que liberou a criança ainda desacordada; que o depoente chegou a pesquisar na internet e achou o verdadeiro medico, Dr. André, e pediu que ele fosse ate a delegacia; (...) que quando descobriu-se a identidade do verdadeiro medico André Almeida, este foi chamado para depor e disse que não tinha nenhum contato com o réu Alex; (...) que apurou-se ao final da investigação que Alex foi contratado por Sarita, como consta no termo de depoimento do próprio Alex; (...) que Alex compareceu espontaneamente na delegacia e em seu depoimento apresentou a versão de que foi contratado por Sarita; que Alex disse que o currículo e a cédula de identidade não eram dele; que Alex confirmou que trabalhou em uma clinica que consta no currículo; que Alex chegou a mencionar que prescreveu os medicamentos à vitima; que após lido trecho de fls. 220, respondeu o depoente que foram aqueles os medicamentos que Alex mencionou; que se recorda de ter ouvido Alex falar que Sarita o orientou por telefone a deixar o país por um ou dois anos ate a poeira baixar; (...) que as imagens do circuito interno de TV foram mostradas a Alex, que se reconheceu e se identificou como a pessoa ilustrada; (...) que Alex falou que prescreveu os medicamentos sob orientação de Sarita; que o Dr. Antonio Carlos disse que Sarita era responsável pelo plantão e pela contratação de Alex; que Alex disse que recebia pessoalmente das mãos de Sarita e que já chegou a receber com cheque pessoal de Sarita; (...) que o depoente ouviu outros médicos do hospital RioMar que confirmaram que Sarita era a responsável pela contratação dos plantonistas; (...) que uma analise da conta reversa do telefone de Alex demonstra que ele se comunicava com Sarita, mesmo após os fatos ´virem à tona´; que Alex confirma isso em seu depoimento; (...) que Alex disse em seu depoimento que ele passou o numero de um CRM para Sarita, e depois esta lhe entregou um carimbo contendo o nome do verdadeiro Dr. André Almeida e o CRM passado por Alex; (...) que Alex disse que quando atendeu Joana, a criança foi liderada do hospital já acordada, entretanto, o pai e a madrasta, sem seus depoimentos afirmaram que no atendimento de Alex, a criança deixou o hospital ainda desacordada; (...)´ Diante desse contexto, não há como acolher-se a impronúncia pretendida pela defesa, ante os indícios suficientes de cometimento dos delitos, tais como apostos na inicial acusatória. Nesta fase deve vigorar o princípio in dubio pro societate, veja-se, a este respeito, os ensinamentos da Jurisprudência: ´Para pronúncia, basta o mero Juízo de probabilidade de que tenha havido um crime, à vista dos indícios de autoria e materialidade. Desnecessária a certeza de sua ocorrência, o que se reserva para a decisão definitiva do Júri. Nessa fase, há de se aplicar o provérbio in dubio pro societate, e não in dubio pro reo, para que não se abstraia o acusado de seu Juízo natural: o tribunal popular. Precedentes do STF e STJ.´ Resp. 115.601-RJ - 6ª Turma - Rel. Min. Anselmo Santiago CONCLUSÃO Ante o exposto, com fulcro no artigo 413, caput do Código de Processo Penal, PRONUNCIO os acusados SARITA FERNANDES PEREIRA como incursa nas penas do artigo 282, parágrafo único c/c art. 29 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas pelo menos no mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar pelo segundo acusado), na forma do artigo 71, todos do CP; art. 171 n/f do art. 71 do CP, e art. 298 do CP; art. 121 , caput n/f do art. 13 §2º, incs. ´a´ e ´b´, todos do CP; e art. 33 da Lei 11.343/2006 n/f do art. 29 do CP, todos em concurso material (art. 69 do CP) e ALEX SANDRO DA CUNHA SOUZA, como incurso nas penas do art. 282, parágrafo único n/f do art. 71 (em relação a todas as vítimas não identificadas até o momento atendidas durante o mês de julho de 2010 na emergência do Hospital Rio Mar); art. 282, parágrafo único c/c art. 285 (resultado morte) em relação à vítima Joanna; art. 171 n/f do art. 71 do CP e art. 304 do CP, e art. 33 da Lei 11.343/2006, todos em concurso material, para que sejam submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri. Recomende-se o Réu ALEX na prisão onde se encontra, já que inalterados os pressupostos fáticos que lastrearam a recentíssima decisão de fls. 1536. Publique-se e intimem-se, dando ciência ao Ministério Público, à Assistência de Acusação e à Defensoria Pública. Com a preclusão, proceda-se na forma do art. 421 do CPP.
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