Marilice Daronco e Marcelo Martins
O quartinho novo, em tons de cor de rosa, foi feito com esmero e sacrifício pelo empilhador de colheitadeira Gilberto Doli Rodrigues Machado, 27 anos, e pela mulher, a dona de casa Juliana Assunção de Moura Machado, 29 anos, para a única filha do casal.
Mas não deu tempo de Júlia Assunção de Moura Machado, 6 anos, aproveitar o espaço da casa com o qual tanto sonhava.
Na tarde da última sexta-feira, ela foi brutalmente assassinada a cerca de 200 metros de onde morava, na Vila Carolina, em Santa Maria.
O autor confesso do crime, Carlos Renan Pinto Galvão, 26 anos, companheiro de uma das primas da menina, contou à polícia que a matou porque não suportava sua constante presença na casa dele para ver o primo, recém-nascido.
Os pais não acreditam na versão do suspeito e buscam explicações para o que aconteceu desde o momento em que a menina deixou sua bicicleta em casa até seu corpo ser encontrado em uma sanga, nos fundos da residência do suspeito.
– Ele era nosso amigo. Vinha tomar mate, veio num aniversário no domingo. Eles vinham buscar a Júlia para ir na casa deles. Ela (Júlia) era uma menina que gostava de crianças. Eu cheguei às 18h30min (sexta) e ainda falei com ele na esquina. Ele ajudou a procurar a Júlia. Não tinha como desconfiar – afirma Gilberto.
Chocado com a brutalidade, o casal não está conseguindo suportar a tristeza.
Gilberto e Juliana acreditam que a filha foi violentada e agredida.
– Eu não entendo por que ele torturou tanto ela – afirma o pai.
Menina contava os dias para ir à escola
Descrita pelos vizinhos como uma menina educada e de sorriso cativante, Júlia sonhava em ir para o colégio.
Em 2013, ela começaria o 1º ano do Ensino Fundamental na Escola Municipal Euclides da Cunha.
Enquanto o tão sonhado momento não chegava, a menina se divertia com a bicicleta que ganhou do pai e da mãe.
A última vez que Juliana viu a filha foi quando ela guardou a bicicleta.
A família acha que foi nessa hora que a menina foi até o suposto local do crime.
– Ela era só alegria. Mas ela também era muito cuidadosa. A Júlia não saía de perto do olhar do pai e da mãe dela. Aqui na rua, ela encantava a todos pela sua educação. Ultimamente, ela estava numa felicidade só. Ela contava os dias e os meses para ir para a escola. A Júlia já estava matriculada e queria muito estudar – conta o padrasto da mãe de Juliana, Antonio da Silva, 44 anos, a quem Júlia chamava de vovô.
Tomado pela tristeza, seu Antonio contou, no sábado, que a neta era o xodó da família.
Polícia vai investigar novas pistas nos próximos dias
Familiares e vizinhos apontaram suspeitas que devem ser analisadas pela polícia nos próximos dias.
A titular da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente de Santa Maria, Carla Dolores Castro de Almeida, preferiu não adiantar informações que fazem parte da investigação.
Ela afirmou que só o que pode dizer, por enquanto, é que aguarda o resultado da perícia.
– Os vizinhos ouviram o Galvão com o som de casa ligado muito alto. Isso não era comum. A gente acha que ele fez isso para despistar os gritos dela – afirma o tio da menina, Juliano Assunção Machado.
Perplexos, vizinhos dizem que vão guardar a lembrança da menina dócil que cativava a todos.
– A Júlia era muito meiguinha, educada e muito bonita. Ela conquistava a todos com seu jeitinho – diz Catiana Ramiro da Silveira, 17 anos, vizinha da vítima.
ENTREVISTA: Gilberto e Juliana, pais de Júlia Na tarde de domingo, os pais da menina assassinada receberam o Diário na casa deles. Confira alguns trechos da conversa abaixo.
Diário de Santa Maria – Como você percebeu que a Júlia tinha sumido?
Juliana – Estávamos na casa da minha mãe. Ela estava brincando na rua de bicicleta. Eu disse para ela: Julinha, vai até o beco e volta. Ela dava uma voltinha e voltava aqui. Mas uma hora, ela guardou a bicicletinha. Eu acho que chamaram ela na casa do Galvão, e ela foi. Chamaram ela (choro). Eu achei que ela estava na casa da Neri (Neridiane). E eu disse para a mãe que ia pedir para ela trazer a Júlia que já estava ficando tarde, mas, quando eu liguei, ela disse que a Júlia nem tinha passado por lá. Depois, ela ligou e disse que viu um carro estranho.
Diário – Vocês acharam que esse carro tinha levado ela?
Gilberto – Todo mundo se concentrou nesse carro. Ele (o suspeito) veio dizer para mim que tinha procurado por toda a parte. Tinha mais de cem pessoas procurando a Júlia, mas todo mundo focou no carro e deixou a sanga de lado. Fomos em postos de combustível e em tudo quanto era lugar. Ele (suspeito) estava ajudando a gente a procurar.
Diário – Quem contou a vocês sobre a morte de Júlia?
Gilberto – O meu cunhado tirou ela da água e a levou até a calçada. Eu vi o corpo cheio de terra. A gente levou ela na viatura. Quando chegamos ao hospital, eu vi o médico e só dizia: salva a minha filha, por favor.
Juliana – Quando eu soube que tinham encontrado o corpo dela, eu passei mal e me levaram para a UPA. Também tinham levado a Júlia para lá. A médica me disse que eles tinham feito tudo o que podiam, mas que ela já tinha chegado morta. Nem sei explicar o que senti. (choro)
Diário – O suspeito já tinha reclamado de a Júlia ir à casa dele?
Gilberto – Não. Eles convidavam ela para ir na casa deles. Mas ele disse que estava planejando o crime... O que deixa a gente aflito é porque ele torturou tanto ela. O pescoço, os bracinhos. Nem um bicho faz isso. Ele tinha feito um buraco para enterrá-la.
Diário – Como era a Júlia?
Gilberto – Ela era agarrada com a gente. Todos os dias, me esperava para pegar uma caroninha de moto. Ela dizia que a moto era dela e que um dia ela ia tirar carteira. Agora, tudo acabou. Mas ela vai estar sempre com a gente, é o nosso anjinho.
Sentimento é de revolta
No final da manhã de sábado, três viaturas e cinco motos do Batalhão de Operações Especiais (BOE) foram chamados na Rua Raimundo Correia para conter os ânimos de vizinhos e de parentes da menina assassinada.
Uma das tias de Júlia agrediu Neridiane, a companheira do suspeito, e teve de ser impedida pelo BOE. Para prevenir que algo pior ocorresse com Neridiane e o filho dela com o suspeito, a Brigada Militar retirou os dois de casa e os levou para um local não divulgado.
– Se tu (Neridiane) voltar pra cá, tu vai morrer. A gente vai botar fogo na casa de vocês – esbravejava uma moradora.
A casa de Neridiane já havia sido invadida por populares que depredaram o local.
O pai dela, Neri Rodrigues, 60 anos, mal parava em pé e se dizia arrasado com a tragédia:
– Não dá para entender. Ele (Galvão) trabalhava em uma obra comigo e parecia uma pessoa normal. Agora, que a Justiça seja feita e que ele pague por essa tragédia.
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