sábado, 20 de outubro de 2012

Dez Minutos

.





Só acontece comigo...

Fujo, me escondo, esquivo...

Nada...

15h 30min de ontem...

O trânsito estava um inferno na frente do Asa Branca na Lapa...

Um moradora de rua seminua sentada de costas no sentido contrário dos carros no meio da via direção Glória...

Passo por ela...

Xingo...

Ela deita no asfalto e cruza as pernas...

Cacete...

Os carros freiam quase antes de atropelarem a mendiga...

A coisa vai ficando perigosa...

Do outro lado da rua, na calçada dos Arcos da Lapa, existe uma patrulha da PM baseada que não está por lá...

Cacete...

Eu não tenho nada a ver com isto, não tenho nada a ver com isto, não tenho nada a ver com isto...

Repito mil vezes para mim mesmo quase como numa infindável ave maria de novena...

Fico olhando pelo retrovisor a confusão...

Um anjo capeta dos infernos espeta meu cerebelo...

E, se nos jornais de amanhã descobrir que a tal desgraçada foi atropelada e morta?!

Estaciono na esquina da Rua Mosqueira em frente a Sala Cecilia Meireles...

Retorno caminhando até a moça que o tempo transformou em  suicida no quarteirão anterior...

Seguro seus dois braços na altura dos cotovelos e puxo até o meio fio...

Ela consegue soltar o braço direito e tenta se desencilhar...

Rogo para que a multidão que assiste a cena me ajude...

Nada, ninguém...

Fico com medo das suas unhas sujas...

Imagino todas doenças que meu preconceito consideram plausíveis...

Não havia mais como voltar atrás...

O trânsito anda...

Alguns imbecis da platéia dos indolentes me aplaudem rindo de minha babaquice...


Mando todos tomar no cu...

Tento negociar com minha vítima de todos nós:

- Te dou 5 reais para você beber uma birita e não voltar a sentar no meio da rua...

Ela balança a cabeça enquanto levanta a camiseta surrada e me mostra os peitos murchos gargalhando desdentada na minha cara...

Mostro a nota de cinco reais...

Ela reclama:

- Caralho, puta que pariu, pensei que era 10; quero dez 'real'!

Enfio minha nota de cinco de volta ao bolso e parto embora ainda escutando  seu 'volta aqui' arrependido...

Na próximo passo batido...

Sou bonzinho idiota mas não sou Madre Teresa de Calcutá, não nasci para purgar o mundo...

Estou ficando de saco cheio...

Qualquer dia aprendo...

Juro que aprendo...

É assim mesmo...

Na hora fiquei puto mas fiz o que me pareceu necessário para não me tornar um eterno insone refém dos demônios da culpa...

Oferendo tudo que tenho...

Um abraço, proteção e somente cinco reais...

Quando resolvo dormir demoro apenas cinco minutos para pegar no sono...

Jamais dez...




Jorge Schweitzer














Um comentário:

  1. Entre uma pesquisa filosófica e outra, nada melhor que uma crônica em movimento para tirar o enfado e manter-me acordada noites a dentro.

    Valeu...
    Arrasei nas pesquisas

    ResponderExcluir