terça-feira, 26 de março de 2013

Síndrome de Rett









Foi hoje...

Ainda há pouco...

Uma moça pegou meu táxi...

Por alguma razão eu estava irritado com tudo...

Procurou diálogo:

- O seu sotaque é do sul,  de onde?

- Rio Grande do Sul...

Eu não queria conversar...

- Poxa, como um gaúcho sai de um lugar tão bacana para vir ao Rio?

Resmungo ao localizar seu sotaque:

- Pelo mesmo motivo que a senhora...

Engraçado, ela não se aborreceu...

Atende o celular e fala somente de doença e tratamento de alguém que imagino idoso da família...

Me chateio quieto...

Ela desliga...

Diz que sente saudades do Sul...

- O senhor ainda toma chimarrão e consegue erva mate aonde?

- É fácil, qualquer supermercado possui... Compro 'Gaúcho' no Mundial que é uma porcaria mas já me acostumei por nunca mais encontrar Saphira...

 Ela ri, diz que sente falta de pinhão, sagú...

Acalmo...

Entramos numa viagem ao tempo...

Sagú e Arroz de Leite é uma porcaria que odeio para sempre...

Conto que gostava de Bolo de Cuca solado ainda quente com manteiga e café preto...

Eu abria, escondido, o forno para solar e minha vó não entendia sua falta de habilidade em fazer cuca no ponto...

Testo seus conhecimentos sobre o Sul falando da minha alpargata roda que ia esfiapando sem jamais eu subir o calcanhar de lona...

Viramos amigos para sempre de nossa infância abandonada nos rincões...

Ela é calma, tranquila...

Confidencio que odeio bucolismo do interior mas no meio da vida da cidade grande durmo sem insônias...

Devo ser o único ser do planeta que adormece tranquilo depois de duas xícaras imensas de nescafé tão pretão quanto tingimento de lavanderia...

Já chimarrão me deixa acesso...

Ela ri da minha proeza...

E conta...

Sua filha de cinco anos de idade com suco de maracujá perde o sono...

- Minha filha tem neuropatia!

Custo a entender...

Me explica sem pieguice...

Sua filha possui a Síndrome de Rett...

Me conta sua rotina e a luta incessante...

Quero saber sobre cura, perspectivas...

Existe histórico de uma pessoa com a doença que chegou aos 52 anos de idade...

Mas sua menina adora rock pesado, bateria e ri com as galinhas pintadinhas...

Procuro não demonstrar minha emoção...

Conto...

Certa vez um passageiro me contou sobre doença degenerativa do filho e me identificou que me conhecia por um texto na Rede onde eu citava que crianças especiais eram consideradas dividades há cinco mil anos antes de Cristo e há registros destas civilizações...

Quase não acreditou que possível algum dia entrar no táxi do autor do texto...

Tive que mostrar meu cartão para ele comprovar meu nome e sobrenome...

Falo sobre o filho do Diogo Mainardi...

Não tenho a menor ideia desta sincronicidade quando nos abala alguma criança imolada na tragédia do covardia da manicure Suzana matar João Felipe e o destino coloque na minha frente alguém que transborda amor apesar da crueldade do destino...

Deve haver alguma razão...




Jorge Schweitzer










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