sábado, 7 de fevereiro de 2015

Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy de 32 anos, dá entrevista à revista Veja



O bandido e seu labirinto

Criminoso mais procurado do Brasil, Playboy, o chefão do tráfico e do roubo de carga que manda e desmanda na favela com a conivência de policiais corruptos, fala a VEJA e diz que está pensando em se entregar


Leslie Leitão


FAMA E PODER - Playboy faz pose em um de seus esconderijos na favela que comanda: o pendor para a exibição (à direita) é uma das marcas de seu reinado, fincado sobre o assistencialismo e o medo

Por fora, a casa de dois cômodos incrustada no alto de uma ladeira em nada se distingue das demais moradias do Morro da Pedreira, um dos mais perigosos do Rio de Janeiro, na Zona Norte. O bandido mais procurado do Brasil poderia estar em qualquer uma delas. Mas, aos poucos, quem segue pelo labirinto de ruelas rumo ao esconderijo do traficante que manda naquela área percebe que a casa no alto da favela é especial. O caminho ladeira acima é balizado por jovens com fuzis. Eles fazem a guarda de Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, por cuja captura se oferece recompensa de 50 000 reais.

Playboy tem 32 anos. Há dezessete está no crime. Em dezembro, seu bando invadiu um galpão do departamento de trânsito da cidade e roubou 197 motos. Pouco antes o grupo havia tomado uma piscina pública, pulado na água com fuzis e se exibido para as próprias câmeras em uma coreografia sinistra de nado sincronizado. As imagens de escárnio chocaram os brasileiros e, exibidas na internet, envergonharam o Brasil no exterior. O óbvio apelido de Playboy lembra a origem de garoto de classe média da Zona Sul que escolheu o caminho do crime, subiu na hierarquia e hoje é o número 1 do morro, que ele comanda usando a combinação clássica: assistencialismo e terror. Compra a liberdade a preço alto, pago em dinheiro a policiais corruptos. Nesta entrevista a VEJA, Playboy pondera os riscos para sua vida e avalia a hipótese de se entregar à Justiça: “Não é por mim, que sou traficante, mas pela minha família”.

Com 1,70 metro, pele amarelada, dentes brancos e bem cuidados e uma conversa que denota certo estudo, apesar da frequente omissão dos plurais, o traficante que comanda atualmente o maior esquema de roubo de cargas do país conta que viu o cerco policial apertar depois dos episódios em que sua gangue zombou do poder público. A coisa agravou-se com a guerra sangrenta que sua facção trava contra um bando rival para expandir seus domínios. Playboy só vê para si dois desfechos possíveis: cadeia ou morte. “Todas as informações que tenho são que a polícia não quer me prender, quer me matar”, diz, sorvendo uísque escocês em copo de plástico, com duas pedras de gelo de água de coco. Cogita a prisão, mas que não seja por muito tempo. “Não quero pegar trinta anos. Estão botando tudo na minha conta. Quero ficar uns anos e viver minha vida.” Todo mundo na favela sabe da presença de Playboy mas silencia sobre o assunto, um círculo de proteção envolto em medo e endurecido por um poderio bélico de 100 fuzis. Ele está sempre em um endereço diferente. As duas sessões de entrevista que deu a VEJA, de mais de sete horas, foram intermediadas por um ex-comparsa que deixou o crime e hoje trabalha na ONG AfroReggae, à qual Playboy recorreu para tentar negociar uma rendição.

Às vezes, o traficante sai do morro e vai pessoalmente à guerra contra quadrilhas rivais. Cada saída é milimetricamente planejada. O resto do tempo ele passa entrincheirado na favela, onde vive a maior parte dos seis filhos. No ano passado, o chefão foi capturado próximo à Pedreira e passou horas algemado. No fim de uma longa negociação, a cifra total, em espécie e em produtos, ultrapassou a casa do milhão. Acertou pagamento de 648 000 reais aos policiais envolvidos na transação. Ainda entregou dois fuzis AK-47 e correntes que seus homens iam tirando do pescoço à medida que tudo era pesado em uma balança: deu 4,5 quilos de ouro. Em outra ocasião, desembolsou 400 000 reais para livrar seu braço-direito e outros 300 000 para que soltassem o motorista particular — por sinal, um ex-PM. Corrupção policial é a regra. Viaturas e blindados da PM batem ponto na favela recolhendo a propina, que chega a 100 000 reais por mês. Embora não negue o chamado “arrego”, Playboy se recusa a entregar os nomes da banda podre que alimenta: “Não alcagueto polícia (sic) que é homem comigo”.

Também guarda a sete chaves o faturamento da quadrilha, que, segundo a polícia, ultrapassa 1 milhão de reais mensais. Na região da cidade onde ele reina, faltam luz, água, escola e sobram lixo e pobreza. É o cenário ideal para angariar simpatia, apoio e poder à base de assistencialismo. Ao estilo de outros chefões de favelas cariocas, Playboy distribui mensalmente centenas de cestas básicas e botijões de gás. Em datas festivas, acrescenta ao pacote caixas de brinquedos. E, nas bocas de fumo que comanda, faz vigorar uma regra: qualquer um que apresenta receita médica leva no ato dinheiro para comprar o remédio, sistema que ele batizou de “caixa eletrônico”. Todas as normas no morro é ele quem dita. Uma enorme faixa anuncia que carro roubado, por exemplo, não pode mais circular naquelas bandas. Estava atraindo a atenção da polícia. Na lógica peculiar da bandidagem, Playboy se define como um “mal necessário”.


O que ele não aborda é o medo que provoca. Na Pedreira, quem desobedece às suas leis está sujeito a punições do tribunal do tráfico. Playboy arbitra sobre tudo. No caso do saque às motos do departamento de trânsito, que ele nega ter ordenado, diz que mandou devolvê-las assim que soube do ocorrido. “Não mandei ninguém pegar aquelas motos, o pessoal do morro foi lá e fez. Mas não eram 197, e sim 105.” Rivais e desobedientes em geral são alvo do tribunal da Pedreira. Nem mesmo policiais escapam de passar pelo jugo do chefão. No ano passado, os homens de Playboy capturaram dois agentes do Batalhão de Operações Especiais (Bope), que circulavam à paisana em seu pedaço. O dono do morro calculou que o prejuízo que teria ao mandar eliminar dois integrantes da tropa de elite seria alto e deixou que partissem. Sobre execuções, Playboy se esquiva. É investigado em quinze inquéritos na Divisão de Homicídios. Condenado a quinze anos e oito meses por assalto, está foragido desde 2009, quando, autorizado pela Justiça, saiu do presídio para visitar a família e não voltou.

Filho de um dono de bancas de jornal e de uma dona de casa de Laranjeiras, típico bairro de classe média carioca, Playboy mantém poucos elos com a vida pré-bandidagem. O mais forte certamente é com a mãe, que sobe a Pedreira com boa frequência para ver o filho. Com a única irmã, funcionária de uma multinacional, os contatos são esporádicos. O gosto por cores berrantes, relógios pesados e correntes de ouro, que ele ostenta nas redes sociais, destoa dos hábitos que tinha nos tempos em que era um menino tímido e franzino conhecido como Mamadeira. Estudava em colégio de padre, onde cravou 93 em religião. “Não havia nada que pudesse indicar que ele se tornaria um criminoso”, diz um amigo de adolescência, hoje empresário.

Por volta dos 14 anos, Playboy começou a frequentar bailes funk e fez amizade com um grupo de assaltantes mirins de seu bairro. Logo passou a andar armado com um revólver, que gostava de mostrar, e foi preso duas vezes antes de completar 18 anos. A mãe suplicava que voltasse à vida de antes, o que ele até tentou, inclusive entrando na Aeronáutica pelas mãos de um padrinho militar, mas acabou expulso depois de ser preso em um assalto. Aos 22 anos, deu-­se um fato decisivo para o voo mais alto no crime. Roubou onze armas de um quartel e vendeu-as a um traficante da Ilha do Governador. Como nunca recebia o pagamento, ele resolveu pegar tudo de volta e levar para o Complexo da Maré, onde entrou como herói e reencontrou um amigo das colônias de férias em Laranjeiras, Pedro Dom, com quem formaria a maior quadrilha de roubo a residências do Rio. Àquela altura, Mamadeira já era Playboy.  

2 comentários:

  1. Praga e vc ze povinhoo safado...fala isso pq os covarde mato e vc sera q tinhaa o cu pra subi la e mata??

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