segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Cabo Sérgio Costa Júnior recebeu visita na cadeia do coronel Claudio Luiz Silva de Oliveira que garantiu que 'tudo ia passar'



Imagens exclusivas mostram a audácia dos assassinos da juíza Patrícia Acioli, morta em agosto passado no Rio. Na tarde do crime, os acusados passearam pelo condomínio onde ela morava. E estudaram as rotas de entrada e saída, que usariam poucas horas depois.

Os depoimentos de dois dos policiais envolvidos foram cruciais para as investigações. Um deles deu uma entrevista reveladora a Sônia Bridi. A reportagem é dela e de Tyndaro Menezes.

Onze de agosto, dia da morte da juíza Patrícia Acioli. São 15h45. Imagens inéditas mostram um homem caminhando na ponte de acesso ao condomínio onde a juíza será assassinada à noite. É o tenente Daniel Benitez, do Batalhão da Polícia Militar de São Gonçalo. Ele entra no condomínio, atravessa a rua principal e se dirige à Rua dos Corais, onde Patrícia morava. Benitez tem a cobertura do cabo Sérgio Costa Júnior, também do 7º Batalhão.


Às 16h10, a motocicleta pilotada por Sérgio faz o mesmo caminho. Cinco minutos depois, os dois deixam juntos o lugar. Benitez ainda está a pé. Sérgio, na moto, segue na frente. São esses dois que, dentro de sete horas, vão disparar 21 tiros contra a juíza.

Benitez usa calça jeans clara, casaco escuro e tênis branco. À noite, está vestido igual, como o Fantástico mostrou há duas semanas. Ao todo, os dois policiais passam meia hora estudando pela última vez o local onde planejam executar o crime.

A polícia chegou a estas imagens depois que o cabo da PM, que estava na garupa da motocicleta e foi um dos autores dos disparos que mataram a juíza, fez um acordo de delação premiada. Contou detalhes do crime em troca da redução da pena.

Pouco depois das 23h, a juíza deixa sua sala no Fórum de São Gonçalo e dirige 29 quilômetros sem perceber que está sendo seguida pela moto de Benitez e Sérgio. Agora, sabe-se que o esquema era ainda maior. Um carro também está no fórum, vigiando a saída da juíza.

A moto demora a pegar e é o carro que começa a seguir. Nele está o cabo Jovanis Falcão Júnior. O carro sai da perseguição quando é alcançado pela moto, onde estão o tenente Benitez e Sérgio, o cabo que fez a delação premiada.

Em entrevista exclusiva ao Fantástico, esse policial revelou que todos os detalhes foram revistos naquele dia porque, sem ter ideia do perigo que corria, a juíza havia escapado de duas emboscadas naquela semana. “Porque ela tinha cancelado uma reconstituição”, conta o cabo. “A outra tentativa, eu não me recordo, mas ela tinha saído mais cedo, dentro da mesma semana”.

Apesar de já ter tido sua imagem divulgada, o policial pediu para seu rosto não ser mostrado durante a entrevista.

Fantástico: A sua mulher sabia da sua participação?
Sérgio: Não. Só ficou sabendo no fórum, quando eu fui fazer o acordo.
Fantástico: Da delação premiada?
Sérgio: Sim.
Fantástico: Você teme pela segurança dela e da sua filha?
Sérgio: Temo.
Fantástico: Por quê?
Sérgio: Saiu nos jornais que foi por causa do meu depoimento que o coronel foi preso. Na verdade, eu não citei o nome do coronel. Quem falou o nome do coronel foi o tenente Benitez.

O tenente Benitez é o condutor da moto. O coronel Cláudio Oliveira era comandante do 7º Batalhão. Esta semana ele foi preso, acusado de ser o mentor do crime.

Outro cabo – Jeferson de Araújo Miranda - que também fez acordo de delação premiada, disse, em depoimento, que ouviu do tenente que o coronel sabia do desejo dele de matar a juíza e ainda teria dito ao tenente: ‘Você me faria um grande favor’.

Fantástico: Quando foi a primeira vez que você ouviu falar sobre assassinar a juíza Patrícia Acioli?
Sérgio: Abril, maio, ele trouxe a ideia para dentro da...
Fantástico: Ele quem?
Sérgio: O tenente trouxe a ideia para dentro da equipe.
Fantástico: A equipe que você diz é o GAT?
Sérgio: Sim.

GAT é o Grupamento de Ações Táticas, uma espécie de tropa de elite em cada batalhão da PM no Rio. Todos os nove homens do GAT de São Gonçalo estão presos.

O cabo Sérgio confessou ser o homem que atirou com duas pistolas, calibres 40 e 45, e apontou o tenente como autor dos tiros de revólver 38.

Fantástico: Como é que você se sentiu quando saiu daquele condomínio depois de todos aqueles tiros no carro da juíza?
Sérgio: Muito arrependido, muito arrependido.
Fantástico: Você se arrependeu na hora ou se arrependeu quando foi preso?
Sérgio: Dois minutos depois já estava arrependido.

Logo depois do assassinato da juíza, o tenente, os dois cabos e cinco policiais foram presos por outro crime: a morte de um jovem em São Gonçalo. A prisão tinha sido determinada pela própria Patrícia Acioli minutos antes de morrer. De dentro da prisão militar, o tenente fazia ligações, que a polícia estava gravando, com autorização da Justiça.

Tenente Daniel Benitez: Sabe se alguém do batalhão vem me visitar aqui nesse final de semana, para eu organizar aqui as visitas?
Desconhecido: O zero-um falou que vai aí, cara, vai aí. E pediu para que os oficiais fossem também para poder dar um apoio moral a vocês, entendeu?
Benitez: Sempre bom receber os amigos, sempre bom receber os amigos. Tranquilo.

Zero-um era o coronel Cláudio.

Fantástico: O coronel esteve na prisão visitando vocês?
Sérgio: Ele fez uma reunião com todos, dando a palavra de conforto e que isso ia passar. Depois que todos saíram, só ficou o tenente conversando com ele, não sei quanto tempo.

No Batalhão Especial Prisional, a cadeia da PM, o tenente não se sentia preso, como mostra nesta conversa com a mãe.

Mãe: Corre o risco de vocês fugirem daí? Como é que você sai daí, meu filho?
Benitez: Isso aqui é a coisa mais fácil de fugir que tem no mundo, é que ninguém quer. Mas daqui a pouco, daqui a pouco, eu devo estar saindo. Mais umas feriazinhas. Férias com festa e cerveja.

Desconhecido: Fala, cabeça.
Benitez: Arruma uma bolsa de viagem aí. Vê se consegue trazer uma seis caixas. Pode ser latão. Qualquer coisa.
Deconhecido: Você quer seis, oito caixas? Como é que eu vou botar isso numa bolsa de viagem, filho?
Benitez: Ah, bota o que der. Bota o que der. Bota duas garrafas de vodca, também.

Chefiando o GAT, o tenente estava acostumado a pegar o que queria. Os cabos confessaram que o grupo tinha um esquema de corrupção. Eles tomavam armas, drogas e dinheiro dos traficantes e chamavam isso de espólio de guerra.

Sérgio: Uma vez o tenente reservou uma parte do espólio para o coronel. Se entregou ou não, não tenho como te afirmar.
Fantástico: Mas ele disse que ia entregar paro coronel.
Sérgio: Separou, sim.
Fantástico: Você lembra quanto era?
Sérgio: Não me recordo.

O outro cabo disse que o movimento semanal era de entre R$ 10mil e R$ 12 mil. O que passava disso ia para o coronel.

“A Patrícia tinha um objetivo, que era pegar o comandante do batalhão por todo o comando de corrupção que ele fazia na comarca de São Gonçalo. Ele era o alvo da Patrícia. Por isso ela foi morta, porque ela colocou em risco o faturamento do batalhão”, explica o desembargador Antonio Siqueira, presidente da Associação de Magistrados/RJ.

Naquela noite, a juíza saiu sozinha do fórum. Sozinha, fez todo o percurso e sozinha estava quando caiu na emboscada em frente à casa dela. Como uma mulher que tinha mandado para a cadeia mais de 60 policiais e que estava ameaçada de morte estava andando sem escolta? Depoimentos e documentos reunidos pela polícia começam a esclarecer bem essa questão.

Em janeiro, o coronel Cláudio transferiu os últimos dois policiais que faziam a escolta da juíza. Um deles era o cabo Poubel, namorado de Patrícia Acioli. No boletim interno da Polícia Militar, uma observação: os dois só poderiam sair dos novos postos com autorização do comandante-geral da PM. O coronel Mário Sergio Duarte pediu demissão depois que o coronel Cláudio foi preso.

O coronel Mário Sérgio, que está se recuperando de uma cirurgia, disse por telefone que a responsabilidade pela segurança de magistrados é do Tribunal de Justiça, e que é o tribunal que escala PMs cedidos por convênio.

No caso dos dois seguranças da juíza, o coronel disse que foram transferidos de volta para a rua junto com outros PMs que estavam fazendo segurança de autoridades sem estarem formalizados por convênio. Sobre o fato de que a transferência destes dois praças só poderia ser feita com autorização expressa dele, o comandante-geral da PM, o coronel disse que isso era uma forma de protegê-los, para evitar que fossem transferidos para o interior do estado.



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