quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Matada morte morrida













Foi punk!


Fui operado as pressas no Hospital  Souza Aguiar do RJ na madrugada de 18 de agosto último...


Quando me informaram que  estado era muito grave achei que estavam blefando...


Meus sintomas começaram com sinais que foram confundindo médicos mesmo após exames de sangue, urina e vários raios-X...


A dor era muito forte e acalmou na primeira medicação no posto da UPA ao lado do hospital...


Daí comecei a transpirar tão intensamente que todos em volta me olhavam assustados em razão do ar condicionado muito forte...


O médico foi chamado e me informou que convocaria o maqueiro imediatamente para me transportar para o Souza Aguiar ao lado...


Me neguei a embarcar naquele carrinho padiola movido a bateria, fui andando ao lado; eu acreditava ridículo um aparato todo para uma simples prisão de ventre...


Cheguei no Souza Aguiar e fui colocado numa tal de sala Verde onde dois médicos que passavam para atender aleatoriamente  outros pacientes pararam ao me avistar me conduzindo  a uma pequena sala e me deitaram na cama apertando minhas barriga inteira; fui mandado imediatamente para tomografia...


Novamente me neguei subir na maca e fui caminhando com o maqueiro ao lado até o sexto andar...


Ao retornar para a tal sala Verde, o resultado da tomografia já havia sido checada pelos dois médicos que haviam me escalado la embaixo e cruzada com o exame de sangue eles mandaram preparar a sala de cirurgia imediatamente...


Eu estava com apendicite e havia perfuração de intestino correndo risco de  entrar em choque, infecção generalizada e falência múltipla de órgãos...


A percepção deste dois médicos foi certeira; eu ainda tentei me socorrer com uma médica - que acabou participando da operação mais a frente - pedindo, rindo muito,  para que ela não permitisse que me operasse pois eu estava muito bem e querendo voltar pra casa...


Um dos médicos depois me contou que se não existissem exames de última geração seria muito difícil algum deles  ter identificado a gravidade do quadro  no momento em que eu disfarçava a dor que normalmente deixa paciente completamente prostrado...


Quando o médico me avisou que deveria ir ao banheiro na minha frente para  tirar a roupa  colocando um macacão e saiu da sala eu me preparei para fugir em direção ao corredor contrário procurando alcançar o Campo de Santana e pegar o primeiro táxi que passasse...


Só que, o médico saiu da sala e ficou bloqueado pela maca em sentido contrário e voltou...


Era a minha maca, não havia mais como eu escapar...


Tirei a roupa, meus pertences foram colocados num guarda volumes para apanhar quando saísse já que eu estava desacompanhado...


Ao preencher minha ficha a moça pediu o telefone de alguém para ser avisado...


Contei que preferia que ninguém fosse avisado e até fiz uma brincadeira:


- Moça, se algo der errado eu retorno noutra carcaça na semana que vem e ainda volto só para lhe cumprimentar pergunto se você ainda lembra de mim...


Ela ri muito...

Eu não sabia se sairia daquela, mas também não queria assustar ninguém desnecessariamente...



Subo, desta vez teve que ser na maca mesmo...


Vou contando as luzes do teto de todos corredores enquanto o maqueiro comenta que finalmente eu tive que usar o trabalho dele...


- É, amigo, não gosto de usar maca ou cadeira de rodas; gosto de comandar meus passos...


A sala de cirurgia se abre, não há mais como fugir...


- Caramba, vocês são sanguinários mesmo; falaram que iriam me esfaquear e estão cumprindo...


Os médicos riem...


A médica anestesista avisa que irá me sedar; usa meu pulso esquerdo; um médico pergunta se senti a agulhada...


- Senti nada, não deve ter enfiado a agulha...


- Já anestesiou, olha só o tamanho da agulha, esta é a diferença de um profissional comum para um top...


A agulha de anestesia na realidade é um cánulo de metal inox não descartável e me mostra um pingo de meu sangue na ponta já que eu insistia em não acreditar...


Colocam e retiram seguidamente  uma máscara de oxigênio pedindo para que eu respire lentamente...


Vou conversando até apagar...


Como se não tivesse havido este tempo de apagão...


As horas subsequentes desapareceram...


Não vi clarão do outro lado...


Nada...


A cirurgia  termina as três horas da madrugada já de terça feira...


Uma voz ao lado me chama:


- Jorge, acorda Jorge, acabou!


Eu ainda estava delirando, alguém me avisa que me debati muito e tiveram que me amarrar mas que me desatará imediatamente...


Pergunto se posso dormir mais um pouco aproveitando a boa sensação da anestesia  e ao ser autorizado peço que voltem a me amarrar já que sou um sonhador compulsivo e certamente vou continuar remexendo os braços...


Sou amarrado novamente, agora, a meu pedido...


Acordei desamarrado e leve...


Só tive consciência completa da gravidade  que transpassei nos dias subsequentes quando a junta médica se reunia diariamente na enfermaria para avaliar cada paciente da unidade...


Mas, encaro sempre os maiores riscos com a mesma serenidade, sem desespero...


Já passei por algumas situações em que manter a calma se tornou meu trunfo...


Fiquei este tempo sem dar notícias por aqui pois prefiro sempre  primeiro resolver meus problemas para depois contar...


Até pensei em não narrar nada, mas no período  em que fiquei internado aconteceram episódios interessantes que contarei mais a frente...


Estou me recuperando para voltar com mais gana ainda...


É emblemático como dois médicos olharam na minha direção numa sala com 30 pessoas em estado gravíssimo  e muitas gemendo alto - e,  em que fui o último a entrar -  eles me escalaram apesar de eu me negar a operar jurando que estava tudo bem e que eu só queria ser medicado e ir embora...


Agora, na boa, eu não poderia ir embora assim sem mais nem menos...


Ainda não fiz o suficiente...


Me foi dado um bônus para completar o que me foi determinado...


Ih, 'determinado',  tá parecendo papo de evangélico...


Mas, não me converti; apesar dos vários pastores que frequentavam minha enfermaria...


Segurei o rojão com lucidez...


E, já que não rezo, nem oro; sabem no que me garanto?


Nesta quantidade toda de gente que reza por mim!


Por favor, não parem; não vou decepcioná-los!


Obrigado!







Jorge Schweitzer



Um comentário:

  1. Não, você não pode ir embora sem antes ver justiça para o caso da Joana. Segura firme aí, que você precisa viver muito pra ver os assassinos na cadeia.

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