Foi punk!
Fui operado as pressas no Hospital
Souza Aguiar do RJ na madrugada de 18 de agosto último...
Quando me informaram que estado
era muito grave achei que estavam blefando...
Meus sintomas começaram com sinais que foram confundindo médicos mesmo
após exames de sangue, urina e vários raios-X...
A dor era muito forte e acalmou na primeira medicação no posto da UPA ao
lado do hospital...
Daí comecei a transpirar tão intensamente que todos em volta me olhavam
assustados em razão do ar condicionado muito forte...
O médico foi chamado e me informou que convocaria o maqueiro imediatamente
para me transportar para o Souza Aguiar ao lado...
Me neguei a embarcar naquele carrinho padiola movido a bateria, fui
andando ao lado; eu acreditava ridículo um aparato todo para uma simples prisão
de ventre...
Cheguei no Souza Aguiar e fui colocado numa tal de sala Verde onde dois
médicos que passavam para atender aleatoriamente outros pacientes pararam ao me avistar me
conduzindo a uma pequena sala e me deitaram
na cama apertando minhas barriga inteira; fui mandado imediatamente para
tomografia...
Novamente me neguei subir na maca e fui caminhando com o maqueiro ao
lado até o sexto andar...
Ao retornar para a tal sala Verde, o resultado da tomografia já havia
sido checada pelos dois médicos que haviam me escalado la embaixo e cruzada com
o exame de sangue eles mandaram preparar a sala de cirurgia imediatamente...
Eu estava com apendicite e havia perfuração de intestino correndo risco
de entrar em choque, infecção
generalizada e falência múltipla de órgãos...
A percepção deste dois médicos foi certeira; eu ainda tentei me socorrer
com uma médica - que acabou participando da operação mais a frente - pedindo,
rindo muito, para que ela não permitisse
que me operasse pois eu estava muito bem e querendo voltar pra casa...
Um dos médicos depois me contou que se não existissem exames de última
geração seria muito difícil algum deles
ter identificado a gravidade do quadro
no momento em que eu disfarçava a dor que normalmente deixa paciente
completamente prostrado...
Quando o médico me avisou que deveria ir ao banheiro na minha frente
para tirar a roupa colocando um macacão e saiu da sala eu me
preparei para fugir em direção ao corredor contrário procurando alcançar o
Campo de Santana e pegar o primeiro táxi que passasse...
Só que, o médico saiu da sala e ficou bloqueado pela maca em sentido
contrário e voltou...
Era a minha maca, não havia mais como eu escapar...
Tirei a roupa, meus pertences foram colocados num guarda volumes para
apanhar quando saísse já que eu estava desacompanhado...
Ao preencher minha ficha a moça pediu o telefone de alguém para ser
avisado...
Contei que preferia que ninguém fosse avisado e até fiz uma brincadeira:
- Moça, se algo der errado eu retorno noutra carcaça na semana que vem e
ainda volto só para lhe cumprimentar pergunto se você ainda lembra de mim...
Ela ri muito...
Eu não sabia se sairia daquela, mas também não queria assustar ninguém desnecessariamente...
Subo, desta vez teve que ser na maca mesmo...
Vou contando as luzes do teto de todos corredores enquanto o maqueiro
comenta que finalmente eu tive que usar o trabalho dele...
- É, amigo, não gosto de usar maca ou cadeira de rodas; gosto de
comandar meus passos...
A sala de cirurgia se abre, não há mais como fugir...
- Caramba, vocês são sanguinários mesmo; falaram que iriam me esfaquear
e estão cumprindo...
Os médicos riem...
A médica anestesista avisa que irá me sedar; usa meu pulso esquerdo; um
médico pergunta se senti a agulhada...
- Senti nada, não deve ter enfiado a agulha...
- Já anestesiou, olha só o tamanho da agulha, esta é a diferença de um
profissional comum para um top...
A agulha de anestesia na realidade é um cánulo de metal inox não
descartável e me mostra um pingo de meu sangue na ponta já que eu insistia em
não acreditar...
Colocam e retiram seguidamente
uma máscara de oxigênio pedindo para que eu respire lentamente...
Vou conversando até apagar...
Como se não tivesse havido este tempo de apagão...
As horas subsequentes desapareceram...
Não vi clarão do outro lado...
Nada...
A cirurgia termina as três horas
da madrugada já de terça feira...
Uma voz ao lado me chama:
- Jorge, acorda Jorge, acabou!
Eu ainda estava delirando, alguém me avisa que me debati muito e tiveram
que me amarrar mas que me desatará imediatamente...
Pergunto se posso dormir mais um pouco aproveitando a boa sensação da
anestesia e ao ser autorizado peço que
voltem a me amarrar já que sou um sonhador compulsivo e certamente vou
continuar remexendo os braços...
Sou amarrado novamente, agora, a meu pedido...
Acordei desamarrado e leve...
Só tive consciência completa da gravidade que transpassei nos dias subsequentes quando
a junta médica se reunia diariamente na enfermaria para avaliar cada paciente
da unidade...
Mas, encaro sempre os maiores riscos com a mesma serenidade, sem
desespero...
Já passei por algumas situações em que manter a calma se tornou meu
trunfo...
Fiquei este tempo sem dar notícias por aqui pois prefiro sempre primeiro resolver meus problemas para depois
contar...
Até pensei em não narrar nada, mas no período em que fiquei internado aconteceram episódios
interessantes que contarei mais a frente...
Estou me recuperando para voltar com mais gana ainda...
É emblemático como dois médicos olharam na minha direção numa sala com
30 pessoas em estado gravíssimo e muitas
gemendo alto - e, em que fui o último a
entrar - eles me escalaram apesar de eu
me negar a operar jurando que estava tudo bem e que eu só queria ser medicado e
ir embora...
Agora, na boa, eu não poderia ir embora assim sem mais nem menos...
Ainda não fiz o suficiente...
Me foi dado um bônus para completar o que me foi determinado...
Ih, 'determinado', tá parecendo
papo de evangélico...
Mas, não me converti; apesar dos vários pastores que frequentavam minha
enfermaria...
Segurei o rojão com lucidez...
E, já que não rezo, nem oro; sabem no que me garanto?
Nesta quantidade toda de gente que reza por mim!
Por favor, não parem; não vou decepcioná-los!
Obrigado!
Jorge Schweitzer
Não, você não pode ir embora sem antes ver justiça para o caso da Joana. Segura firme aí, que você precisa viver muito pra ver os assassinos na cadeia.
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