sábado, 30 de junho de 2012

Solo de Clarineta

.



.










"Lembro-me de que certa noite eu teria uns 14 anos, quando muito me encarregaram de segurar uma lâmpada elétrica à cabeceira da mesa de operações, enquanto um médico fazia os primeiros curativos num pobre-diabo que soldados da Polícia Mundial haviam carneado. (...)

Apesar do horror e da náusea, continuei firme onde estava, talvez pensando assim: se esse caboclo pode agüentar tudo isso sem gemer, porque não hei de poder ficar segurando esta lâmpada para ajudar a costurar esses talhos e salvar essa vida? (...)
.

Desde que, adulto, comecei a escrever romances, tem me animado até hoje a idéia de que o menos que o escritor pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos.

Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror.

Se não tivermos uma lâmpada acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como sinal de que não desertamos nosso posto."



Érico Veríssimo





Um comentário:

  1. Amo Érico Veríssimo! aqueles livros maravilhosos da série "o tempo e o vento" embalaram muitas tardes adolescente de inverno no friozinho da serra gaúcha.
    Ai que saudades daquela época sem a tonelada de responsabilidades dessa vida adulta que suga todo nosso precioso tempo.

    ResponderExcluir