Foi na noite de ontem, sexta-feira...
A escritora Nélida Piñon pegou meu táxi na Fonte da Saudade a caminho de Ipanema...
A reconheci de pronto mas aguardei ela puxar assunto para não importuná-la...
Ela havia esquecido o nome da rua mas disse que tinha um hotel na esquina da praia...
- É o Cizar?
Ela brinca:
- Tua pronúncia está perfeita!
- Na realidade Caesar com ae juntos em latim a gente pronuncia a; mas escutei tanto o Amaury Junior falando Cizar que adotei, ficou mais granfino...
- Sabe, motorista, que Caesar é também o nome de uma salada maravilhosa?
Contornamos a Lagoa Rodrigo de Freitas e fomos comentando sobre os peixes mortos que estavam sendo recolhidos pela Comlurb naquele instante...
Comentei que ninguém tem coragem de apontar mas o Jóquei Clube do Rio deve despejar material orgânico das suas cocheiras direto nas águas da lagoa, e não deve ser pouco, e que bastaria a prefeitura instalar sensores para detectar a irregularidade...
Nélida diz que se até na modesta casa dela existe sensor para tudo não há dificuldades...
- Olha, na boa, não acredito que uma escritora conhecida no mundo inteiro resida em casa modesta.. Se a senhora quiser conhecer casa modesta eu lhe dou carona até o Pavão...
Ela ri muito, fica surpresa em eu saber sua identidade e acaba concordando que tem uma residência muito boa...
Falamos sobre a morte do escritor Günter Grass nesta semana e relembro que outro acadêmico esteve três ou quatro vezes no meu táxi, o jornalista Luiz Paulo Horta; que por acaso era seu amigo pessoal...
Nélida me conta foi empossada na semana passada como titular da Cátedra José Bonifácio do Centro Ibero Americano da USP e quando foi conferir se eles haviam aberto sua conta salário para depositar o equivalente ao cargo descobriu que esquecerem deste detalhe deveras importante...
E, como não poderia perder a viagem, solicito que a escritora Nélida Piñon (que integrante e ex-presidente da ABL) me apresente ao também imortal José Sarney no próximo chá das seis...
- Olha, Jorge, ele tem ido muito pouco as reuniões; a Dona Marly está muito doente... E, ele sempre foi de uma gentileza completa em todos nossos encontros...
- Por favor, não se deixe impressionar; Sarney é profissional...
- É...
- Só por curiosidade, o cargo de imortal é remunerado?
- A gente ganha um jeton por comparecimento...
- E, é uma remuneração bacana?
- É um valor interessante; alguns dos imortais que até contam com esta remuneração como subsistência...
- É bom fiscalizar se o Sarney não anda recebendo sem comparecer...
Nélida diz que possuo um ótimo e raro vocabulário que preferi não perguntar se isto a surpreendeu por se tratar de um taxista...
Brinco que gostaria de encontrar o Marimbondo de Fogo só para lhe dar um abraço tão forte que lhe proporcione ser inoculado pelo próprio veneno e perecer na hora...
Nélida me conta sobre suas constantes viagens internacionais para palestras e me jura que jamais foi traída por ego inflado...
Antes de saltar ela comenta sobre o perigo da vaidade indevida de qualquer um de nós em final de vida que pode macular uma biografia inteira apenas num simples ato falho...
Nélida no meu táxi é um desses presentes incomuns que o destino nos reserva...
Jorge Schweitzer
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